Suaveolens

Este blog foi criado por um cearense apaixonado por plantas medicinais e por sua terra natal. O título Suaveolens é uma homenagem a Hyptis suaveolens uma planta medicinal e cheirosa chamada Bamburral no Ceará, e Hortelã do Mato em Brasília. Consultora Técnica: VANESSA DA SILVA MATTOS

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Local: Brasília, Distrito Federal, Brazil

Cearense, nascido em Fortaleza, no Ceará. Criado em Ipueiras, no mesmo estado até os oito anos. Foi universitário de agronomia em Fortaleza e em Recife. Formou-se em Pernambuco, na Universidade Rural. Obteve o título de Mestre em Microbiologia dos Solos pelo Instituto de Micologia da Universidade Federal de Pernambuco. Também obteve o Mestrado e o Doutorado em Fitopatologia pela Universidade de Brasília. Atualmente é pesquisador colaborador da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília.

30.12.07

MINHA IPUEIRAS QUERIDA

Por
Francisco Assis Martins Fernandes

Foi lá na Serra da Ibiapaba que nasci. O primogênito de muitos irmãos. Botei os pés em Ipueiras pelos idos de 1946. O sonho dos estudos era maior do que eu. Naquele tempo minha mãe já me ensinara o ABC. Consegui, com meu primo Crispim, uma Cartilha. Foi um momento de alegria e de esperanças. De sonhos de futuro.

Vendo meu entusiasmo pelas Letras, meu pai permitiu que eu fosse estudar em Ipueiras. Fiquei na casa de um primo, o Chico Bilina, na Estação. A primeira professora foi dona Colú. Ficou minha amiga. Até arranjou uns livros para eu ler. A vida era muito dura. A festa da Imaculada era um momento de alegria. Encontrava meus parentes do Ipuzinho, da Gázea, do Buriti, da Matriz de São Gonçalo e da Boa Vista.

Meu tinha grandes amigos em Ipueiras. Entre eles lembro-me do sr. Sebastião Mattos, Raimundo Aragão, Pedro Aragão, Raul Catunda, Idálio Frota, seu Guarani, Edmundo Medeiros, Wencery de Souza, Costa Mattos, Sebastião Mattos Sobrinho, padre Francisco Correia Lima e muitos outros.

Dona Colú achou que eu já era capaz de ir para o curso mais avançado. Ela mesma de indicou para a professora Isa Catunda. Era simpática. Tinha uma caligrafia muito bonita. Ao final do ano, ela me disse: Você precisa de uma escola mais elevada... De tanto insistir, meu pai que era amigo dos Mourões, colocou-me na Escola de Dona Esther Mello Mourão. Ela tinha a fama de ser bravíssima.

Comecei os estudos. Fui morar na casa do sr. Gonçalo de Araújo Lima. Dedicava-me aos estudos de Matemática, Geografia, Português e História. Dona Esther não permitia brincadeira. Ali tinha colegas como filhos do sr. Idálio Frota, dos Pinhos. Nas aulas de matemática, vi a palmatória tinir nas mãos de muitos, inclusive das meninas. Era terrível, pois ela perguntava a tabuada, exemplo 17x1, vezes 2... vezes 9. Quem não soubesse esperava a palmatória daquele que acertasse. Muita gente apanhava. Muitos ficavam as duas horas de aula ajoelhados... de castigo. O sonho era ir para outra Escola.

Eu lamentava aquelas aulas de “terror”. Fui apresentado para o diretor do Educandário N. S. da Conceição: prof. Sebastião Mattos Sobrinho, conhecido por Nenê Mattos. Ela trabalhava com o seu tio Sebastião Mattos. Sua esposa, dona Mundita, era professora. Viera de Fortaleza. Gostava muito de bandolim. Quando sobrava um tempinho, ela tocava. Eu ficava encantado. Tinham um filho, o Jean Kleber, que ficou meu amigo-irmão. Um garoto que trabalhava com eles era o Zaca (Zacarias). Conhecendo minha situação, ofereceram a meu pai, a residência e as aulas no próprio colégio. Havia também a Maria José que ajudava na limpeza da escola. Eu admirava a biblioteca do sr. Mattos. Ele possuía um Rádio que sintonizava a BBC de Londres. Eu ficava a seu lado ouvindo as notícias.

Naquele tempo tive que comprar um uniforme do colégio. O Jean era pequeno. Dava os primeiros passos nos estudos. No Educandário N. S. da Conceição estudavam os filhos da mais alta sociedade ipueirense. Sete de setembro era marcado pela “Parada”. Tínhamos que marchar.

À noite, era interessante um passeio pela Praça Getúlio Vargas. As meninas observavam os meninos e vice-versa. Os filhos de Pedro Aragão, Idálio Frota, Raul Catunda, Gonçalo Ximenes, dos Pinhos, dos Souza, dos Moreira. Mas o tempo foi passando. Alguns partiam para estudar em Fortaleza e até no Rio de Janeiro.

Foi uma dessas ocasiões que meus “mecenas” resolveram deixar Ipueiras. Optaram por Fortaleza. Eu andava triste por ter que voltar para a Serra. Meu pai já me dizia: “Agora, filho, já sabe ler, escrever, contar. É hora de me ajudar a criar o resto da família”. Sr. Mattos e dona Mundita, vendo os meus sonhos caírem por terra, me convidaram para ir com eles para a Capital. Lá eu tinha dois caminhos: ou ingressar no Exército ou num Instituto Religioso, que tinha uma gráfica. Sr. Mattos chegou a levar-me ao seu amigo Capitão Bandeira na 10ª Região Militar. Depois de falar comigo, aconselhou-me a pedir dispensa do Serviço Militar. Foi o que fiz. Depois de uma semana estava eu no Instituto da Pia Sociedade de São Paulo, na Rua Barão do Rio Branco.

Lembro-me com saudade de MINHA IPUEIRAS QUERIDA! “Ó tempora, ó mores!”. Hoje, distante no tempo e no espaço, posso parafrasear o poeta e dizer:

Oh, que saudades que tenho
Da aurora de minha vida,
De minha Ipueiras querida,
Que os anos não trazem mais...
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Francisco Assis Martins Fernandes: formado em Jornalismo pela Universidade dos Estudos Gerais (1968), em Radio e Televisão pela Universidade de São Paulo-USP (1971), em Filosofia pela Universidade de Mogi das Cruzes (1974). Possui Livre-Docência pela Universidade de São Paulo (1988), Doutorado pela Universidade de São Paulo 1985), Mestrado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (1978) e aperfeiçoamento em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (1982). É professor aposentado da USP e da Universidade de Taubaté (Unitau). Lecionou na USP, na UFP (Portugal), na UMC, e na PUC-CAMPINAS. Atualmente faz parte da equipe de avaliadores do SINAES, INEP/MEC.

29.12.07

FÉ E RAZÃO EM ABRAÇO











Por
Marcondes Rosa
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Natal! Machado, o de Assis, me cai, com saudades da "velha noite amiga, noite cristã, berço do Nazareno" (Séc. XIX), a lembrar, desde São Francisco , o de Assis (1223), os hoje raros presépios. Em nossa volta, o marketing a espraiar sede nos lucros, e a distorcer ceias, Papai Noel, presentes, canções natalinas... E a nos ficar, a chave-de-ouro do famoso Soneto de Natal: "Mudaria o natal ou mudei eu?"

Nesse quadro, uma luz: a de Bento XVI, a pautar aos cristãos, vida futura a não se perder no vazio e no chão. Salva-nos a esperança, a nos dar sentido à vida cá na terra e à ressurrecta após. Míopes, se não aliadas à fé e a caridade, em nossa política, os esforços em prol da tríade "liberdade, igualdade e fraternidade". Também, ideais como o marxista, se restritos à pura "ordem e distribuição econômica". E até a ciência, se, solitária e cega, não se pautar por esse horizonte.

Só a cáritas - o amor a irmanar-nos como obra e filhos de Deus - poderá redimir-nos. Possível, a "amizade entre a inteligência e a fé" a nos trazer "maturidade científica e espiritual" (diz o papa a universitários).

Voltar àquela "noite cristã, berço do Nazareno" impõe-nos repensar-nos a jornada na terra: fé, esperança e caridade, mãos dadas a nos rever passado, presente e futuro. Assim, as hoje múltiplas inteligências. A da fé (a transcendente), no consórcio com as várias outras, a nos repensar ética e vida política, na construção de nosso amanhã.

E, urgente, a de nossa educação (escolar e social), hoje, nesta terra de Santa Cruz, vista entre as piores do mundo, para que forme mulheres e homens na integrada feição de profissional (o construtor), cidadão (o ente social e político) e pessoa (em sua dimensão transcendente maior).Tudo sob o olhar "assim na terra como no céu".

São meus votos. Que assim seja!
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Foto do astronauta:
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Marcondes Rosa de Sousa, advogado, é professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Universidade Estadual do Ceará (UECe). É uma das maiores autoridades em educação do Brasil. Ex-presidente do Conselho de Educação do Ceará e do Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais de Educação, é Colunista do jornal " O Povo ", onde mantém seus artigos quinzenais.

28.12.07

O CASTELO DO PLÁCIDO


Por
Jean Kleber Mattos

Aos 15 anos de idade, início dos anos 60, eu tinha um grande fascínio por um castelo que havia na Avenida Santos Dumont em Fortaleza, perto do colégio onde estudava, Colégio São João.
Com máquinas fotográficas baratas e antigas, destas que o pai não mais utiliza e dá ao filho para ele “curtir”, eu e meus colegas da Congregação Mariana do Cristo Rei o fotografávamos sempre que podíamos.
Eu não sabia bem porque aquele castelo estava ali. Ele era do tipo que povoava minha mente fantasiosa cheia de histórias de príncipes e princesas, de Branca de Neve a Bela Adormecida. Nunca procurei uma explicação. Talvez preferisse fantasiar. Imaginar que ali morariam um príncipe e uma princesa.
Passados vários anos tive a curiosidade, numa de minhas idas a Fortaleza após o êxodo, de revê-lo. Informaram-me que não mais existia. Em seu lugar haviam erigido o Centro de Artesanato Luiza Távora, uma obra considerada artística, feita com troncos de carnaubeira.
O palácio pertencera a um ricaço, Plácido de Carvalho, que o erigira atendendo ao desejo de sua esposa Pierina Rossi, uma italiana que condicionara seu casamento com ele e conseqüente a vinda de mudança para o Brasil, à construção do palácio, que esteve a cargo do construtor João Sabóia Barbosa. Isso tudo por volta de 1912. Assim, casaram e viveram juntos até a morte de Plácido. 

No relato encontrado hoje no site:  ceara.pro.br/Fortaleza/index.htm há uma nota dizendo que essa história é contada de boca em boca na cidade, não havendo confirmação oficial.

No entanto, as palavras “Hotel Excelsior” colocadas na “busca” do site: travel.webshots.com/photo  nos trazem a informação de que o construtor do Hotel, de propriedade de Plácido de Carvalho, foi Natali Rossi, irmão de Pierina Rossi.


Após a morte de Plácido, a viúva Pierina casou-se com o arquiteto Emílio Hinko, um húngaro que adotou Fortaleza como sua cidade, nela tendo construído obras grandiosas, algumas das quais remanescem até hoje, como por exemplo a sede do Náutico Atlético Cearense, onde predomina o estilo barroco genovês, com marcada influência da cidade italiana de Gênova, onde o arquiteto viveu vários anos antes de migrar para o Brasil.
Também está documentado que mais tarde, nos anos 30, o castelo seria a sede do Serviço de Malária, departamento federal que equivale hoje a Sucam. Na década de 70, o castelo foi demolido para se construir no local um supermercado, o que não chegou a termo. Pouco depois, o governo estadual desapropriou a área e nela fez erigir o Centro de Artesanato Luiza Távora, que veio a ser destruído pelos cupins e mais tarde reconstruído.
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Mensagem gravada no site :
ceara.pro.br/Fortaleza/index.htm. Fortaleza Antiga: Este site é dedicado a todos que amam Fortaleza e sua história. Aos que não a amam, naveguem no site e passem a freqüentar o primeiro grupo. Conheça as Ruas, os Cafés, Teatros, Igrejas, Logradouros, Lojas, Prédios, Castelos que Fortaleza um dia teve ...
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Jean Kleber de Abreu Mattos, cearense, nascido em Fortaleza, viveu em Ipueiras dos dois aos oito anos de idade. Foi universitário de agronomia em Fortaleza e em Recife. Formou-se em Pernambuco. Atualmente doutor em fitopatologia, é professor da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília.

26.12.07

UM CONTO DE FÉ

Por
Dalinha Catunda

Natal é tempo de reflexão, tempo de renovar a fé e cultivar a esperança. Celebrar a vida, o nascimento, aprender que, só existe perdão porque há pecados. Às vezes um gesto, uma palavra, valem muito mais do que presentes caros traduzidos em obrigações.

Maria foi uma nordestina que chorou muitos natais longe da família, mas nunca perdeu sua fé. É dela esse pequeno conto, que relato agora.

Não sei bem, mas acho que era Maria... Sim, era Maria!!!! No fundo era Maria.
Retirante nordestina, seca grande, muito grande... a maior de todas!!!! estiagem de sentimentos. As gotas que brotavam dos seus olhos foram muitas, mas não o suficiente para fazer brotar a compreensão naquele chão árido.

E lá se foi Maria mundo a fora. Tempos de peregrinação. Ao longo da caminhada ia perdendo cintura e na mesma proporção ganhando barriga.

Semente plantada, botão que floresce, fruto que vinga.

Um anjo vestido de branco apareceu naquela noite e velou seu sono. O anjo tinha o nome dos pais de Jesus, José Maria, acolheu a flor e o fruto, como se os quisesse proteger e confortá-los, esquecendo suas obrigações cantou para eles uma cantiga de ninar.

Maria sofrida e desencantada viu brilhar naquele momento a luz da esperança em seu coração. Mas, sabia que sua paixão apenas começava, não escaparia da coroa de espinhos.

Maria perdeu tudo, tudo que podiam lhe tirar, inclusive o fruto, ainda verde.

Contudo, Maria preservou o que ela tinha de mais sagrado, a fé. E foi essa fé em Deus que fez com que Maria não antecipasse sua passagem para o mundo negro, pois mais do que ninguém ela merece o reino da glória.
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Foto da apresentação do menino Jesus (Teatro): www.eliezergomes.com/.../
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Maria de Lourdes Aragão Catunda – POETISA, ESCRITORA E CORDELISTA. Nascida e criada em Ipueiras-CE, conhecida popularmente como Dalinha Catunda, vive atualmente no Rio de Janeiro. Publica nos jornais "Diário do Nordeste" e "O Povo", nas revistas "Cidade Universidade" e "Municípios" e nos blogs: Primeira Coluna, Ipueiras e Ethos-Paidéia. É co-gestora convidada do blog Suaveolens, além de ter blog próprio: http://www.cantinhodadalinha.blogspot.com/

24.12.07

ASSIM ERA IPUEIRAS NAS NOITES DE NATAL

Por
Bérgson Frota
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A praça central era a mais iluminada.
Muitas luzes amarelas em espaços próximos faziam dela uma verdadeira fonte de luz que se destacava na cidade inteira.
Era para lá principalmente que corria toda a garotada, fascinados pela luminosidade e alegria contagiante que só o natal nos fazia sentir.
As casas eram enfeitadas com adornos brilhantes e pisca-piscas, e poucas deixavam de ter uma árvore de natal recheada de bolas de vidro coloridas postas quase sempre à vista de quem por fora olhasse com fácil curiosidade.
Logo que a noite mais se adiantava, casais maduros e jovens passavam em direção à igreja matriz. Caminhavam numa harmonia respeitosa e lenta para esperar na nave do templo ou no amplo patamar em frente, o início da missa do galo.

Como criança olhava aquele ritual religioso mais como uma extensão da festa sem pensar ainda na profunda importância daquela celebração.
A noite corria e as luzes que brilhavam iam aos poucos se apagando, a constelação que para mim parecia pregada naquela cidade cercada de morros, misteriosamente sumia e o sono me tomava. Pela manhã os presentes.
E o fascínio em procurar e abri-los, fazendo de conta que o bom velhinho e não meus pais, era quem os trouxera.
E foi nessa alegria que os natais naquela pequena cidade me marcaram.
O tempo passou, mas a magia daquelas noites em Ipueiras ficaram gravadas.
E sempre quando chega o natal, eu já adulto e já distante, caminho nas lembranças daquelas ruas, que minha memória trabalha e as reconstrói, onde o tempo parecia eterno e nunca passava, onde a cidade plena de alegria plasmava uma atmosfera de paz e luz que emanava fantasia.
Assim eram as noites iluminadas de natal em Ipueiras, assim foram às noites iluminadas de natal em Ipueiras, e lá estava eu, longe do tempo onde sobre elas um dia haveria de escrever.
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Foto noturna de Ipueiras: acervo do autor.
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Bérgson Frota, formado em Filosofia/Licenciatura pela Universidade Estadual do Ceará (UECE) e em Direito pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR), é um prestigiado cronista ipueirense e pesquisador da história e da geografia do Ceará, especialmente da cidade de Ipueiras. É professor visitante da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA) e professor de Grego Clássico no Seminário da Prainha - Fortaleza.

23.12.07

NATAL E A ESPERANÇA

Por
JOSÉ COSTA MATOS


Naquela mesma velha noite amiga, noite cristã, berço do Nazareno, um homem busca repetir, no soneto de Machado de Assis, a beleza espiritual que todos buscamos repetir agora. Sobra-lhe confusão na pergunta:
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Mudaria o Natal, ou mudei eu?
Porque estamos sem saber o que é Natal e o que somos, na passagem do aniversário do filho de Maria de Nazaré.
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A propaganda consumista impõe enganos desse entendimento: arquiteta presépios, arruma jogos de luzes para o deslumbramento dos compradores. Mas desestimula as perguntas sobre os extravios humanos, em tantas encruzilhadas mal sinalizadas.
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Os magos procuraram rumo nas estrelas para o encontro do Natal. Trouxeram ouro, incenso e mirra para o Menino, nascido na manjedoura porque os pais não conseguiram lugar nas hospedarias de Belém. E nós não precisamos de rumos? Uma busca orientada exige que pensemos. E tudo nos induz a não pensar. Consumismo é isto.
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A ilusão de evitar a angústia é afundar no aturdimento. Para isso, as prateleiras das lojas estão repletas de uísques e champanhe vencedores das barreiras alfandegárias. Porque vêm do trabalho distante de outros povos, dão prestígios aos bebedores, além dos desejados desmontes da reflexão. E dirão: Jesus Cristo gostava também de festas, também bebia o seu vinho... Sim.
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Ele assumiu a natureza humana, exceto o pecado. Participava de festas. Aceitou o banquete oferecido por Zaqueu, o cobrador de impostos. Agradeceu as comidas especiais que lhe preparavam em amizade as irmãs Marta e Maria de Betânia. No entanto, não deixava de ir ao deserto, para as meditações que resgatam a verdade humana, em dias como estes, quando se adensa fumaceiro dos noticiários e há o risco de que as esperanças também anoiteçam.
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Ele não ficou insensível aos dramas dos pobres. As multidões o seguiam, sem comer por três dias. E lá estão, nos Evangelhos de Mateus e de Marcos, estas palavras da segunda multiplicação dos pães: ´Eu tenho pena dessa gente´. E ordenou que se multiplicassem os sete pães e alguns peixinhos. Comeram quatro mil, sem contar as mulheres e as crianças...´
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Mudaria o Natal, ou mudei eu?
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As filosofias dos últimos séculos mudaram a humanidade. Centraram as formas de vida na substituição de Deus por muitos deuses. E hoje são deuses a conta bancária; o apartamento de cobertura; o automóvel de luxo; o computador que desemprega operários; o prestígio da imagem na televisão... O esquecimento de Deus amesquinhou o significado do Natal. O vazio de Deus nas almas se povoou de medos. Medos, muitos pavores.
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Séculos antes de Cristo, Isaías falava dos direitos humanos à alegria, com o futuro nascimento do Nazareno. Um retorno à leitura do Profeta do Advento renova o entendimento do Natal como festa do espírito. Porque o Natal vivido apenas com uísque e champanhe e presentes não orienta a viagem da raça humana no tempo.
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Mas é possível mudar a direção da mídia. Mudar o pensamento criativo. Mudar a luz negra pavorosamente fixa nas imaginações. Leão Magno, papa de 440 a 461, falou da teofania de Jesus Cristo: ´Alegremo-nos. Não pode haver tristeza no dia em que nasce a vida, uma vida que destrói o temor da morte.´
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Natal, cristãos. Aleluia.



Diário do Nordeste – 23.12.07
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Ilustrações: www.geocities.com/.../simbolosdonatal.htm
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José Costa Matos, poeta, contista e escritor cearense premiado, é membro da Academia Cearense de Letras. É natural de Ipueiras-Ceará. Para saber mais sobre Costa Matos leia a crônica COSTA MATOS POETA E ESCRITOR neste blog, mediante o link abaixo:

21.12.07

A CASA DE ARTUR

Por
Luiz Alpiano Viana
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A casa de Artur é uma choupana de palha de carnaúba que fica no alto de uma montanha de onde se vê, em todas as direções, um cenário que é um sonho. É um quadro de encher os olhos, cuja beleza não tem as cores pintadas pelos humanos! O lugar é um presente da própria natureza a pouquíssimas pessoas neste mundo.
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De lá ele tem uma visão privilegiada para ver um admirável quadro verde que tem a maciez de um tapete persa que a mão de Deus teceu. O vento açoita fortemente a copa das gigantescas árvores que gemem como um faminto filhote de urso abandonado.
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Para comemorar o nascimento de Cristo, Artur construiu em sua humilde residência um lindo presépio, utilizando galhos secos encontrados na serrania. Nessa mesma época os ricos compram lindos presepes já montados com fina tecnologia do século. Ele sabe que sua própria casa é um presépio original. Mas o presépio dos ricos não vai tirar o brilho da confraternização natalina que todos os anos sua casa sedia.
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A família se reúne orgulhosamente para a festa de Natal como se tivesse feito o mais lindo e rico presépio do mundo. O Divino Espírito Santo é representado por uma pedrinha que tem a aparência de uma criança recém nascida, encontrada por sua filha no riacho das Antas quando peralteava como uma nativa ao ar livre da montanha; os Reis Magos são três coquinhos babaçus, sendo um deles mais escuro que o outro a que Izaura chama de Baltazar; Maria é uma boneca de cabelos longos e olhos claros, trazida por um visitante quando fazia trilha e montanhismo logo que aqui chegara Artur, há mais de dez anos; de um ninho abandonado no alto de uma centenária oiticica, que ensombra os canteiros de hortaliças, fez a manjedoura e nela, com requinte de pobreza e simplicidade, pôs o Menino, aquele que tirou os pecados do mundo.
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As visitas ao Menino se sucedem dia e noite por moradores da região que ainda acreditam que o amor está no coração de todas as pessoas, sejam elas ricas, pobres, pretas ou brancas. Pela manhã a família forma um círculo em volta da Lapinha para adorar, de joelhos e mãos postas, a Criança que sem os petrechos da vida moderna descansa sob os cuidados de Maria Santíssima. Do outro lado da sala, num biongo rústico de porta fechada por uma tanga, sua mulher amamenta o mais novo filho que nasceu neste Natal. Ela imita, com gestos e carinho de mãe, os mesmos cuidados que Jesus está tendo por Nossa Senhora.
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Como seu marido, ela descobriu que sua casa é, na verdade, um presépio que não tem móveis, cama e máquina de lavar, mas tem uma criancinha que é a imagem e a semelhança de Cristo. No coração do casal tem muito amor, é uma coisa divina que deveria acontecer com todos os seres humanos. Eles cuidam dos filhos com a mesma dedicação de Maria e José.
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Se houver a continuação da instituição família, onde se ensinam todos os gestos de amor e respeito às pessoas, haverá no futuro, filhos amáveis, dedicados, respeitosos e tementes a Deus. O Criador promove o lar onde se prega o amor ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo. Lembrar-nos-emos de que quando festejamos a vinda de Jesus estamos consagrando o amor á família e harmonia entre os povos. Se quisermos teremos uma sociedade isenta de ódio e abundante em ações nobres.
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Nossa casa tem que ser um santuário que sirva como exemplo, que acolha o transeunte cansado e faminto, que nas noites de frio agasalhe. A família é também o farol de referência para os que navegam sem bússola. Não deixemos que somente nessa época do ano a palavra de Deus se torne o equilíbrio da humanidade.
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O presépio improvisado por Artur simboliza a união de todos. Eis o grande mistério da vida: há lares que não têm comida; há famílias que têm filhos, que têm filho e não têm pais; que não têm amor nem esperança. Pessoas sem perspectiva de uma vida digna estão por toda parte. Outras moram em luxuosas habitações e não são felizes; e algumas, como a de Artur, que moram em casebres no alto de um morro ou numa das favelas dos rios de janeiros, vivem felizes.
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As coisas de Deus nos encantam tanto que nos deixam emocionados. Vale a pena sentir esse estado de emoção. E quando sentimos essa paz dentro de nós as lágrimas de alegria e felicidade inundam nossa face. Esperamos renovar nesse Natal os mais profundos sentimentos de amor e respeito por tudo que existe. É imperativo que as pessoas usem da simplicidade de Artur como modelo de libertação. Do presépio construído no coração de cada um de nós tiramos lições de fraternidade. A paz de espírito que a data simboliza traz a certeza de que Deus nos ama muito. E por que não O amemos também!
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FELIZ NATAL!
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Luiz Alpiano Viana, nascido e criado em Ipueiras, morou mais tarde em Crateús. Atualmente é funcionário aposentado do Banco do Brasil. Morou no Distrito Federal até meados de 2007 quando finalmente voltou a morar no Ceará, em Fortaleza.

20.12.07

AS VENDEDORAS DE SONHOS

Por
Marcondes Rosa de Sousa
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Um sonho! É o que ela diz querer me vender. Um sonho para casais, o que inclui um cruzeiro pelo Caribe e a promessa de noites inesquecíveis nos mais luxuosos hotéis de Miami, Orlando (nos Estados Unidos) e Buenos Aires (na Argentina). Um sonho, tornado iminente pela compra de uma simples cautela.
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Nada de armações. Ali, diante de mim, a comprovação de tudo. O sorteio das cautelas dar-se-á no próximo dia 13 de dezembro, às 20 horas, em um jantar a ser oferecido no Iate Clube de Fortaleza. Ela me mostra o prospecto de informações sobre o sorteio. Patrocinando e garantindo tudo, estava ali a Sociedade dos Amigos da Democracia, da qual a vendedora dizia-se não apenas membro como uma das fiadoras. Uma entidade sem fins lucrativos, que realizará o sorteio com o curioso e poético objetivo assim expresso: manter os amigos unidos e as portas da sociedade abertas para todo o mundo".
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A vendedora me fala do sonho ali posto à venda. Enquanto ela se perde nos sonhos que me tenta vender, confesso que minhas atenções se voltam mais para ela, a vendedora, E, por isso mesmo, termino por não me conter, abrindo-me num explosivo frouxo de riso. Explico-me. Eu já antevia essa visita. Só não esperava que o objeto da venda fosse um sonho (mesmo um sonho real, factível e assegurado aos vencedores). De outras vezes, havia sido igualmente visitado. Mas, nessas ocasiões, a vendedora conseguia me passar cautelas de carros velhos, jóias que dizia de família e, da última vez, de uma placa de ouro.
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Agora, era diferente. Quem diria! O prêmio do sorteio era um sonho. E sonhos por onde? Por um mundo bem diferente dos sonhos pregados, nas praças, pela vendedora às suas habituais platéias de excluídos: desta vez, nas praças, pelos ambientes e paisagens de um mundo capitalista e burguês. quem te viu, quem te vê!" - não me contenho, sorrindo.
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A vendedora, sentindo-se flagrada em sua contradição, desmancha-se, por sua vez, numa incontida gargalhada e justifica-se: "P’ra vocé ver aonde o aperto e a determinação de pagar as contas termina levando a gente!’. E aí discorremos, por longo tempo, sobre aonde, na vida pessoal, os percalços políticos terminam nos conduzindo.
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Na verdade, tem sido sempre assim. Após cada eleição, lá se vêm elas (Rosa e Maria) à cata dos amigos (sejam de seu círculo político ou não). Elas entram, de corpo e alma, em uma empreitada política. E vivem o sonho e a aventura de sua caminhada. Jamais se sentem derrotadas, conquistem ou não os cargos formais. Nessa aventura, gastam tudo o que têm e o que não têm. Ao fim de tudo, restam os pedaços de conta, pendurados por toda parte. Desta vez, conta-me Rosa, a coisa foi braba. Navegaram, solitárias, por uma via marginal, desamparadas do tradicional apoio dos demais partidos da esquerda. E, isso, no plano pessoal, custou-lhes caro.
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Numa campanha, de fato, tudo são gastos. E, por ironia, o que legalmente é gratuito (a propaganda pela televisão e o rádio) termina, na prática, sendo o mais caro. "È certo (explica-me Rosa) que tínhamos o tempo gratuito. Mas a televisão e o rádio não estão aí, ao vivo, à nossa disposição. Tivemos de contratar uma produtora para fazer os programas. E, aí, um aluguel de som aqui, uma viagem ali, somados aos gastos com a propaganda dita gratuita, ficou dependurada uma conta de mais de cem mil reais".
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"Vendemos tudo", diz-me Rosa num estranho ar de preocupação, mas de satisfação pessoal... Maria, segundo ela, já se desfez do carro, do computador e de outros objetos pessoais. Entrou, fundo e arriscadamente, no cheque-ouro e levantou empréstimos nos bancos, Tudo isso, sem muito horizonte à frente, já que em 31 de dezembro terá terminado o seu mandato de deputada federal e, em conseqüência, não terá mais vencimentos.
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Rosa, a vendedora de sonhos, me pede ajuda. Decido ajudá-las (a ela e Maria) apostando no sonho. Ela me pergunta por pessoas outras na Universidade. Digo-lhe onde encontrá-las. Ela quer mais, de nossa tradicional amizade. Insinua-me que posso ficar com uma dezena de cautelas: "Você pode passá-las aos seus amigos do PSDB - diz-me numa leve ironia. Retruco-lhe que meus amigos do PSDB não poderão dedicar-se aos devaneios de viajar em janeiro porque deverão estar no batente governamental, aqui ou em Brasília. Compro eu, porque em janeiro deverei tirar férias, estando portanto com disposição e tempo para embarcar em sonhos...
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Ela se despede, entre sorrisos. Uma professora entra-me na sala. E me pergunta, surpresa, o porquê de minha ajuda a Rosa e Maria. Pergunto-lhe se ela quer que eu comece a responder do ponto de vista político ou do psicológico. A professora, sem entender, dá de ombros, como a me dizer: tanto faz.
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Começo lhe dizendo que, pessoalmente, me fascina o divergente de mim. E, brincando, afirmo que gosto tanto do diferente que casei com uma mulher. Se gostasse do igual a mim, deveria achar melhor viver com uma pessoa do mesmo sexo. Para mim, o oposto a mim me completa. E, cercando-me do diferente de mim, tento ser um equilíbrio plural de minhas próprias divergências. Por isso, ao ocupar qualquer cargo público, gosto de escolher pessoas de formação dilferente da minha, para o trabalho a meu lado, Nenhum deles de minha mesma formação. Dessa forma, penso, termino por enriquecer minha visão.
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Sob a perspectiva política, creio, como insinua Maquiavel, desde 1536, que, entre a oposição e a situação, há uma certa cumplicidade. A oposição joga um papel fundamental no sentido da sustentabilidade da situação. E, para mim, Rosa e Maria, são um pouco o símbolo disso. Não votei em nenhuma das duas. Meu voto para Governador e para o Senado foi público. Votei em Tasso (fiz campanha) e, nos jornais, assinei manifesto de solidariedade e apoio a Sérgio Machado e Lúcio Alcântara.
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Mas, de Maria e de Rosa, não me neguei a ficar com alguns de seus bônus. E, dessa forma, ajudei-as. Por quê? Porque, primeiro, elas são um pedaço esquecido de mim. São meu lado romântico, aventureiro, inconseqüente, utópico, quixotesco, anárquico até. E me sinto satisfeito pagando um tributo a esse lado, necessário para o equilíbrio de mim.
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Politicamente, meus sonhos são outros, em relação aos de Rosa e Maria. Elas acreditam na democracia direta e eu, ao contrário, sou parlamentarista. Minha crença é, portanto, naquilo que elas querem acabar (o parlamento). Elas acreditam na revolução armada. Eu sou de paz, da razão e do voto. Sua utopia é um socialismo de um horizonte distante. Sou mais pragmático.
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Acredito no sonho possível do equilíbrio social-democrático. Nem tanto ao mar nem tanto à terra. Sou pela síntese do que a humanidade conseguiu de bom no socialismo e no capitalismo. Sou, finalmente, contra o lado mau dos dois caminhos.
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Mas, em meu sonho, cabem os sonhos de Rosa e Maria. Na sociedade que imagino, há lugar e função para elas. Em minha utopia, os sonhos mais extremos são salutares e imprescindíveis. E, nesse mundo plural, as mais
diversas tribos hão de ter seus dialetos, seus deuses, suas crenças, pois democracia, para mim, mais que o império da maioria é a convivência saudável das minorias.
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Rosa e Maria são a expressão e canal dos excluídos, São os necessários camelôs dos muitos que habitam nossas praças, favelas e ruas. Outro dia, Tasso, citando Nelson Rodrigues, disse que a unanimidade é burra. Pois bem, em nosso meio político, Rosa e Maria podem simbolizar a porção necessária para que tenhamos uma sociedade inteligente.
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Rosa e Maria, as vendedoras de sonhos, estão aí às voltas com uma conta de cem mil reais a pagar. Essa conta não é só delas. A mim, como pessoa, faz-me bem, a meu pluralismo, ajudar a saldar essa dívida: A mim,. cidadão, sinto-me responsável por contribuir com um pequeno quinhão. Afinal, posso até não gostar. Mas elas cumprem uma função e são necessárias em nossa sociedade. Por isso, pago, com prazer, minha cota.
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E você? Você pode não ter nada a ver com Maria ou com Rosa. Pode até não gostar nada delas. E se confessar integrante do percentual de pessoas que a elas rejeita ou até delas tem raiva. Mas pense bem. Elas podem ser o seu lado escondido, a sua face oculta, como, de mim, são o pedaço romântico que perdi, lá pelos anos 60... Se você pensar assim, não precisa explicações maiores, como as que tento dar a você. Apenas chame sua companheira ou seu companheiro e lhe proponha: "Que tal a gente apelar para a sorte e, quem sabe, viver o sonho de algumas noites inesquecíveis em Miami, Orlando ou Buenos Aires?"
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Fará bem a você. Fará bem à vitalidade e à maturidade de nossa democracia!... E, se assim for, todos os anônimos camelôs de sonhos, que habitam a nossa sociedade, sensibilizados, lhe agradecerão.
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(Em tributo ao Prof. Raimundo Alberto Normando, então vice-reitor da Universidade Federal do Ceará e falecido nas festas de ano passado, que apesar de conhecido por suas posturas tidas por muitos como conservadoras, sensibilizou-se com a crônica, telefonando-me e pedindo a mim que lhe enviasse cautelas. Ele, a mim, argumentou que se sentia no dever de às "vendedoras de sonhos" pagar o tributo de que se sentia devedor).
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Foto do transatlântico: www.scafo.com.br/noticia.asp?codn=957
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Marcondes Rosa de Sousa, advogado, é professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Universidade Estadual do Ceará (UECe). É uma das maiores autoridades em educação do Brasil. Ex-presidente do Conselho de Educação do Ceará e do Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais de Educação, é Colunista do jornal " O Povo ", onde mantém seus artigos quinzenais.

17.12.07

CONTO DE NATAL

CARTA AO PAPAI NOEL

Por
Dalinha Catunda

Era uma vez uma menina chamada Maria, que, apesar dos tempos modernos e do turbilhão de informações, ainda acreditava em Papai Noel. E foi pensando assim que ela resolveu escrever uma carta ao tal velhinho.

Querido Papai Noel,

Eu sei que o senhor é bonzinho e vive agradando as crianças. Meu pedido é um pouco confuso, mas sei que, para um Papai Noel, nada é difícil.
Adorei um pião que meu irmão ganhou em seu aniversário. Passo horas vendo ele girar.

Quero que o senhor me traga, nesse Natal, um presente bem colorido, com muitas listas, que gire que nem o pião do meu irmão, mas tem que ser um brinquedo de menina.

Conto com o senhor meu bom velhinho.

Um abraço da Maria.

Dobrou a carta e entregou a sua mãe, pedindo-lhe que a colocasse no correio. A mãe, comovida com a ingenuidade da filha, guardou a carta com carinho, prometendo a si mesma que faria o possível para realizar o sonho de Maria.

Recorreu então à madrinha da menina, que costumava viajar ao Paraguai com a finalidade de fazer compras, para abastecer sua lojinha de brinquedos. A madrinha emocionou-se com o relato. E querendo alimentar a inocência da afilhada, prontificou-se a ser cúmplice nessa aventura.

- Não se preocupe, comadre. Eu darei um jeito. Nossa menina terá o presente desejado.

Enfim, o grande dia! Véspera de Natal... Maria ajeitou seu sapatinho embaixo da cama. Participou da ceia. Deu uma olhadinha no presépio. Admirou a árvore de Natal. E, em seguida, voltou para o quarto. Queria dormir cedo e acordar mais cedo ainda. Queria saber que surpresa Papai Noel teria preparado para ela. A ansiedade era grande, não maior do que alegria do dia seguinte.
Tava lá, ao lado do seu sapatinho, uma caixa pequena embrulhada num papel colorido e com muitas fitas. Desesperado, ela tenta abrir a caixa de qualquer de qualquer jeito. E, em segundos, consegue retirar, dentro da caixinha, uma linda bailarina.

A boneca era fosforescente, as listas coloridas da roupinha brilhavam tanto que chegavam a doer nos olhinhos da pequena. Correu para mostrar a mãe.

- Olha, mãe, olha! Papai Noel atendeu ao meu pedido. Pena que o brinquedinho não gira... Mas é tão lindo! Tão colorido!

A mãe, vendo que era uma caixinha de música, pediu para ver. Pegou o brinquedo e deu corda. A graciosa bailarina começou a dançar e rodopiar em cima do piano, para a imensa alegria de Maria, sob olhar emocionado de sua mãe.

Ainda vale a pena apostar na inocência de uma criança.
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Conto publicado originalmente no blog
http://www.cantinhodadalinha.blogspot.com/
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Maria de Lourdes Aragão Catunda – POETISA, ESCRITORA E CORDELISTA. Nascida e criada em Ipueiras-CE, conhecida popularmente como Dalinha Catunda, vive atualmente no Rio de Janeiro. Publica nos jornais "Diário do Nordeste" e "O Povo", nas revistas "Cidade Universidade" e "Municípios" e nos blogs: Primeira Coluna, Ipueiras e Ethos-Paidéia. É co-gestora convidada do blog Suaveolens, além de ter blog próprio: http://www.cantinhodadalinha.blogspot.com/

16.12.07

O CASARÃO DA OTACILÂNDIA

Por
Bérgson Frota

Situado ainda numa região de mata semi-virgem, cercada de oitizeiros, oiticicas e jatobás, guarda o casarão da Otacilândia uma ostentosa porém rústica arquitetura.

Embora não esteja em um morro, a parte detrás da construção termina numa íngreme descida de pedras, grandes árvores e mata fechada que se cuidadosamente percorrida, chega-se ao sinuoso rio do Engenho, ainda recebendo água das grotas para mais adiante juntar-se a outro, e formar novo rio.

Outrora conhecido como Engenho dos Padres, a construção remonta a primeira metade do século XIX, passando ainda no mesmo século para a família de um potentoso coronel da região.

Assim descreveu de forma detalhada sua impressão sobre o casarão o Pe. Francisco Correia em obra publicada : “Próximo a Ipueiras há um lugarejo chamado Engenho, de propriedade do conhecido político Otacílio Mota. O Coronel Otacílio faleceu em 1948, e esse lugar passou a se chamar “Otacilândia”.

É um bom sítio, distinguindo-se sobretudo pelo seu casarão de 260 portas e janelas, com o aspecto de uma verdadeira Babilônia, tão grande é esta casa. No seu conjunto possui também uma capela privada.”

Outro fato faz do casarão da Otacilândia um ponto de importância histórica para a política de Ipueiras e de toda zona norte da região do Estado. Foi lá que nasceu e cresceu até vir a residir em Fortaleza o destacado político Aquiles Peres Mota.

Com o passar dos anos o casarão sofreu poucas reformas. Permanecendo quase inalterado, sendo ainda habitado, é um marco na história que delimita e descreve as grandes moradias pertencentes aos antigos coronéis, há muito assentadas e pouco preservadas aos pés da azulada Ibiapaba.

( Publicado no O Povo, Fortaleza-Ce, em 17.11.2007)
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Foto do Casarão da Otacilândia : acervo do município de Ipueiras.
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Bérgson Frota, formado em Filosofia/Licenciatura pela Universidade Estadual do Ceará (UECE) e em Direito pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR), é um prestigiado cronista ipueirense e pesquisador da história e da geografia do Ceará, especialmente da cidade de Ipueiras. É professor visitante da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA) e professor de Grego Clássico no Seminário da Prainha - Fortaleza.

14.12.07

TEM UM GRANDE HOTEL EM TEU MUNDO?

Por
José do Vale Pinheiro Feitosa

Um ambiente muito diferente de tudo que é conhecimento do mundo. Escadas que se sucedem com outras escadas de um andar acima do outro. E apenas sabia que as escadas iam do chão ao sótão. Em cada andar tantas portas, entradas uma após as outras e dentro delas vidas que se multiplicavam em adereços, livros, discos, uma escova para dentes, um pente para cabelos. E ninguém era da família, parente ou aderente.

Um Grande Hotel, numa esquina para a Praça Siqueira Campos, na rua que vai para o Cine Moderno é um portal mágico entre séculos. No mundo do ambiente rural, sem luz elétrica, com água de cacimba, um paiol de milho, estrado levantado de queijos, o silêncio dos automotores, mas o grito do pavão. Um Grande Hotel é, de fato, uma abertura da Aida de Verdi para o interior fabuloso do mundo Egípcio, de um Etíope que cobiçava tal civilização.

Lá morava o professor de Português que corrigia estas falas, os sujeitos e seus predicados. Morou um sujeito dos Inhamuns, saíra do sertão, fora para o Rio de Janeiro, viveu mais de 30 anos naquela cidade e voltou, como os elefantes para morrer em volta de seu lago africano. Tal sujeito dormia e dormia, acordava pelas onze horas e logo comia seu almoço numa bacia carregada de misturas alimentares. O resto do tempo, entre o Grande Hotel e longas conversas com gentes que andam pelas ruas do Crato em busca de conversa como sopro de vida.

O circo chegou na cidade. Isso no tempo que um circo era tão grande que um shopping, destes que sucedem os mitos arquitetônicos da identidade urbana, não chegavam aos seus pés. Eram muito mais variados, animais selvagens, daqueles que só as fitas de cinema fotografaram, palhaços, dramas, trapézios, equilibristas, dançarinas e bandas. Mas o maior de tudo, a multidão que se acotovelava para adquirir uma entrada do espetáculo.

Pois foi na porta do Grande Hotel que a mulher do circo, uma bailarina de seus 16 anos, linda de doer, um sorriso de derreter, um corpo de acender, cabelos em coque que prometiam a enxurrada de todas as paixões. E do Grande Hotel saiu um filete de amor que, feito os versos de Marti, postos na Guatanamera, encantaram mais que o mar, tão imenso a prometer eternidade.

Mas do meu mundo do prédio do Grande Hotel, Edifício Figueira Teles escorre pela Rua Dr. João Pessoa uma permanência que não necessita de substrato para viver. Saindo do número 114, era lá que a cidade me dava um endereço, passava, com algum dinheiro no bolso, na porta da Livraria Católica que conhecia como a palma da mão. Em seguida, estava em frente às portas da loja elegante de Ernani Silva, que além de tudo honrava o centro da cidade, morando num sobrado sobre o próprio negócio. A casa de Dr. Elísio, corpulento homem entre a medicina e seu belíssimo sítio com engenho d´água. Mais alguns passos e encontrava o Deputado Filemon Teles, cabelos brancos de neve, bengala, uma vivacidade de velho político conservador, adonado da vida política da cidade.

Qual o quê? Era na esquina do Grande Hotel, bem no bico com vista plena para exuberância da praça que o menino caia nos braços da urbe luminosa. Um bar, mesa com pés de ferro fundido, tampo de uma pedra branca, cadeiras confortáveis, balcão com mostruário de vidros, o barulho de um refrigerador de picolé e sorvete, azulejos, quadros pendurados nas paredes e móveis de madeira que subiam cheios de vendas acima do balcão.

Nesse bar, sob a vida do Grande Hotel, uma bomboneira de vidro, arredondada e compartimentada, giratória, cheia de sonhos de crianças. A cada pequeno giro os papeis chamativos dos bombons faiscavam nos olhos e mourejavam a boca. Eram tantas as possibilidades que só a cidade pode. O exercício era girar para ver antes de apontar o dedo para o desejo sobre todos outros desejos já conhecidos.

Uma perfeita cor transparente do vermelho com mistura de azul, um solferino de sedução. Impresso um casal, ele vestido com um fraque preto e ela com vestido longo amarelo, dançando aberto como asas em evolução de vôo. Em seguida, um papel alumínio, hoje tão comum, mas, então, um brilho de prata no olhar. Finalmente a terra dos sonhos, com mais da metade em formato de globo e no outro lado um pólo achatado. Tinha este cosmo uma crosta de chocolate puro. Abaixo do chocolate um biscoito crocante, aerado como os waffles. No centro deste mundo de sabor, o núcleo era um mistério doce, com lembranças de castanhas.

E disseram que o Grande Hotel irá abaixo para dar vida a mais uma rua Miguel Lima Verde mutilada ou quem sabe arremedada. E dos escombros, surgirá, como um fênix banal, sem qualquer vida nova, sem simpatia, qualquer identidade, o palco do faz de conta de um Shopping, em inglês mesmo, pois é deste tipo de suicídio que a inapetência urbana vive.

No final quem lembrará do Crato?

Mas um bombom SONHO DE VALSA ninguém me rouba.





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Nota do blog: Marcondes Rosa, moderador do grupo Ethos-Paidéia, plotou esta bela crônica no grupo. Entramos em contato com José do Vale imediatamente. Ele aquiesceu. A sua bela crônica honra hoje o Suaveolens.
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Foto do Hotel Caravelle em Ipueiras-Ceará. Acervo do blog Suaveolens.
Foto do bombom: acervo do autor José do Vale.
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José do Vale Pinheiro Feitosa – nascido na cidade de Crato, Ceará, em dezembro de 1948, morando no Rio de Janeiro há 34 anos. Médico do Ministério da Saúde. Publicou o Romance Paracuru em 2003, assina matérias em alguns blogs e jornais. Em literatura agita crônicas, contos, poesia e ensaios de temas variados. Gosta de pintar e tem alguns trabalhos de escultura.

13.12.07

CASEI-ME HOJE

Por
Angela Rodrigues Gurgel

Casei-me hoje,
Já não suportava tanta dor e solidão,
Casei-me com um sonho,
E a este sonho dei-lhe combustão,
Transformando-o em minha realidade!
Casei-me hoje com o desejo de felicidade,
Àquela que me completa, me deixa inteira...
Aquela que extravasa meus afetos...
Que faz minha presença, um raio de esperança...
O desejo presente em todos os instantes...
Casei-me comigo mesma...
Com minha vontade
De ser grande, completa, verdadeira...
Casei-me com minha alma
Que se reflete e se completa nela mesma...
Casei-me hoje...
Despedi-me da solidão,
Minha companheira dos últimos dias...
Casei-me hoje...
Não planejei o futuro,
Quero construí-lo um pouco a cada dia,
Se possível a quatro mãos, dois corações...
Em comunhão com meus sonhos.....!
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Foto da flor da paixão: http//fragmagens.blog.simplesnet.pt
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Ângela M. Rodrigues de Oliveira P. Gurgel, poetisa, nasceu em Mossoró-RN, tendo vivido em outras cidades do Rio Grande do Norte (Almino Afonso, Caraúbas, Caicó e Natal) e do Pará (Tucuruí e Marabá). Atualmente mora em Mossoró-RN. Graduada em Ciências Sociais, cursa atualmente Filosofia na UERN (Universidade do Estado do RN) e Direito na UnP (Universidade Potiguar). Já exerceu o cargo de Secretária de Educação em Caráubas, onde também foi Diretora de uma escola de Ensino Médio.

12.12.07

O ANIVERSÁRIO DE TEREZA MOURÃO

Em Homenagem a Tereza Mourão
Por
Dalinha Catunda
Filha de Ipueiras, mensageira da paz, dedicada aos amigos, assim é Tereza Mourão.
Muito cedo saiu de Ipueiras, indo morar em Fortaleza.
Como ave que perde seu ninho, por ter perdido seus pais, voou para terras distantes, a procura de outros horizontes, deixando seu Ceará.
Novos ninhos construiu, e formou sua família. Os casamentos se foram, porém não ficou vazia, dois filhos bem desejados, Inácio Emiliano Melo Mourão Pinto, o mais velho, e Francisco Delano Melo Mourão, o caçula, preenchem e encantam sua vida.
Distante de Ipueiras ela levanta a bandeira de sua terra natal. É uma notável divulgadora dos valores de sua terra e sempre que possível visita seu rincão. Pois lá mora um passado feliz, onde as lembranças da infância e juventude reclamam sua visita.
Para Tereza visitar lugares e parentes, não é matar saudades, é simplesmente desenterrar alegrias e não perder o vínculo com novas gerações.
Adepta do espiritismo, dona de uma luz singular, uma paz maior nos transmite. Sempre aponta caminhos, sem pretensão de apontar verdades, deixando apenas suas palavras fluírem sem a intenção de incuti-las a todo custo.
Hoje dia 12 de dezembro, essa querida amiga,educada, meiga, inteligente, dona de um par de olhos azuis que jamais ficaram cinzentos com as mazelas da vida, completa mais um ano de vida para felicidade dos que convivem com ela.
A Tereza Mourão, ou Terezinha do seu Tim, meus mais sinceros parabéns. Que a paz, a saúde e a felicidade sejam presente divino a ela concedido por Deus Nosso Senhor.
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Foto de Tereza Mourão: acervo do orkut da homenageada.
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Nota do blog: Tereza Mourão é co-gestora deste blog, o Suaveolens. Juntamente com Jean Kleber e Dalinha Catunda, integra a equipe fundadora do blog. Nós que fazemos o Suaveolens, sentimo-nos honrados em tê-la conosco. Parabéns, Tereza.
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Maria de Lourdes Aragão Catunda – POETISA, ESCRITORA E CORDELISTA. Nascida e criada em Ipueiras-CE, conhecida popularmente como Dalinha Catunda, vive atualmente no Rio de Janeiro. Publica nos jornais "Diário do Nordeste" e "O Povo", nas revistas "Cidade Universidade" e "Municípios" e nos blogs: Primeira Coluna, Ipueiras e Ethos-Paidéia. É co-gestora convidada do blog Suaveolens, além de ter blog próprio:
http://www.cantinhodadalinha.blogspot.com/

8.12.07

IPUEIRAS É ASSIM...(PARTE II)


Por
Luiz Alpiano Viana
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Ipueiras não se encolheu, não ficou calada, nem tremeu assustada com a velocidade que o século XXI impôs às Nações; não fugiu do progresso e muito menos das reviravoltas da vida política nacional.
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Seu povo está atento, principalmente os atuais vereadores que trocaram os nomes de algumas das principais ruas tidas como seculares e históricas; esses logradouros públicos levavam o nome de homens cuja folha de serviço prestada à cultura e às artes é visível e inegável. Parece-me que os vultos históricos a que me refiro nada fizeram pela cidade ou pelo País.
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Provavelmente nossos parlamentares não tiveram acesso à sua biografia e por isso os expurgaram, penso que sem maldade, do arquivo memória da cidade. Não quero aqui tratá-los de desrespeitosos com a coisa pública. Contudo, uma simples consulta através dos meios de comunicações locais, teria apontado a vontade popular para a realização de tais mudanças.
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Nas grandes democracias o povo é o poder, o governo e a decisão final de tudo. O povo é o termômetro, e assim sendo, sua vontade tem que ser respeitada porque é soberana e democrática.
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Emociona-me a reforma de restauração feita pela Prefeitura no prédio da Estação. Transitei por entre operários e matei eternas saudades. Depois de voltear à construção senti falta do sino que anunciava a chegada e a saída dos trens de passageiros.
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Também não encontrei o relógio de parede em algarismos romanos que media sem reclamação a passagem do tempo. Consultei-o várias vezes durante o dia, à noite e até de madrugada. Deve ter sido aposentado, quem sabe! Está cansado, já trabalhou sem parar durante décadas. Não imagino que o tenham destruído! Não é possível! Deve estar em algum lugar bem protegido.
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Outro calçadão semelhante ao do Açude da Rua escorrega-se pela margem da linha férrea e termina também num posto de gasolina. Há muita semelhança entre os dois. Esse é apenas menor que o outro, mas foi construído com o mesmo requinte e profissionalismo dos bons mestres da atual construção civil. Bem iluminado, arquitetonicamente belo, atrai adultos e jovens para as caminhadas matinais e noturnas que só preserva a saúde. Tanto um quanto o outro são cartões postais da cidade que é minha, que é sua, que é nossa! Eles vestem a cidade de um impressionismo saudável em que o visitante se sente à vontade e quer permanecer por mais tempo.
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São os Calçadões alguns dos pontos cumulativos e enriquecedores da propaganda turística do município. Mais para o centro da cidade já existem ruas asfaltadas. Há também Praças reconstruídas com a ousadia refinada de paisagistas de nomeada.
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No alto do Cristo Redentor vêem-se um emaranhado de torres e antenas que caracterizam o avanço de tecnologia de ponta. Em se tratando de matéria de comunicação, Ipueiras não ficou de fora da arrancada abrupta da tecnológica, foi globalizada também e ver o mundo com os mesmos olhos das grandes nações do ocidente.
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Em minha cidade, sábado sempre foi sinônimo de feira. Atualmente há feira todos os dias da semana. Frutas, legumes e verduras são encontrados até de madrugada. O comércio também cresceu assaz, embora sejam poucos os comerciantes de minha época. Não mais existem Pedro Aragão, Guarani, Luiz Aragão, Antônio Luciano nem Simãozinho na esquina da Esplanada com seu serviço de alto-falantes.
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Os jovens daquela época namoravam de verdade e se amavam como ninguém. Diz Zélia Gatai: "nos anos 60 e 70 não se ficava, mas, namorava-se como nunca e morria-se de amor". Vivi a época mais linda do romantismo de todos os tempos. Há motivo para dizer que era feliz e não sabia!
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Mais para o centro da cidade já existem ruas asfaltadas. Há também Praças reconstruídas com a ousadia refinada de paisagistas de nomeada.
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Entristeci-me, pois, por não ter visto minhas professoras Adelaíde Marques Cavalcante e D. Alice. Elas deixaram na juventude a marca do bem. Oxalá haverão de viver por muito mais tempo para modelarem as novas gerações de mestres e professores. Elas são verdadeiras pérolas e nunca deixarão de praticar exemplos de cidadania. Eu sinceramente não consigo esquecê-las.
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Ninguém esquece mesmo dos belos momentos, das alegrias e também das tristezas. Por menor que seja a recordação o ipueirense anota e escreve. Faz rimas, poemas, contos e crônicas com um único objetivo: louvar a cidade em que nasceu. O ipueirense é homem feliz, tem prazer de viver e é grato pelos frutos que colheu. Faz questão de não perder sua identidade matuta e cabocla.
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Quem nasceu ou viveu nessa cidade pode até morrer bem longe dela e por lá se enterrar, mas mesmo assim sua alma voltará e dirá para todos: Obrigada!
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Foto: Praça do Centro da Cidade. Antiga Praça Getúlio Vargas.Acervo do blog Suaveolens.
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Luiz Alpiano Viana, nascido e criado em Ipueiras, morou mais tarde em Crateús. Atualmente é funcionário aposentado do Banco do Brasil. Morou no Distrito Federal até meados de 2007 quando finalmente voltou a morar no Ceará, em Fortaleza.

5.12.07

PROFESSOR APOSENTADO DA UFC RECEBE A MEDALHA DA ORDEM NACIONAL DO MÉRITO CIENTÍFICO



Professor José Júlio da Ponte Filho foi professor de Fitopatologia da Escola de Agronomia da Universidade do Ceará por décadas. Conhecí-o nos anos 60 e mais tarde, nos anos 70, estagiei como pós-graduado em seu laboratório de nematologia.
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É um grande professor, além de um grande amigo. Mais recentemente tem se dedicado a desenvolver métodos de combate às pragas e doenças da lavoura com métodos ecologicamente corretos, utilizando os resíduos próprios da propriedade agrícola. Dele a descoberta de que "manipueira" sub-produto das fábricas de farinha pode ser utilizada como inseticida e nematicida natural.
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Septuagenário, segue promovendo encontros e congressos sobre a utilização de substâncias naturais no controle fitossanitário.
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Deu suporte durante anos à agricultura do Ceará, em seu laboratório de fitopatologia, viajando para o local sempre que algum patógeno estivesse ameaçando a lavoura, principalmente nos perímetros irrigados pelo DNOCS.
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São muitos os seus feitos e fastidioso seria enumerá-los. Merecida a homenagem e a condecoração.
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A comenda foi entregue pelo Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.
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A notícia foi dada em caderno especial do jornal O POVO de Fortaleza em 02-11-2007.
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O professor enviou-nos cópia dos flagrantes e do diploma com a seguinte nota: "Ao caro Jean Kleber, o meu aluno de ontem, o colega e amigo de hoje. Com um abraço. José Júlio da Ponte".
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PARABÉNS A TODOS NÓS POR MAIS ESTA CONQUISTA CEARENSE !

4.12.07

IPUEIRAS É ASSIM...( I )

Por
Luiz Alpiano Viana

Estive lá, revi velhos amigos e conheci um Calçadão construído pela Prefeitura com os mesmos materiais do da Avenida Atlântica, no Rio de Janeiro. As mesmas pedrinhas, pretas, brancas e marrons. Para o bom observador, o desenho do calçadão tem a mesma curvatura da Praia de Copacabana.

Aproveitei a noite silenciosa e o cochicho dos casais que namoravam nos bancos do passeio e fiz minha caminhada noturna desde o sangradouro do velho açude até o posto de gasolina. O ambiente tem a feição de uma incipiente favela porque os bairros de periferias em qualquer cidade do Brasil não têm infra-estrutura. Esses benefícios só aparecem com o advento de famílias ricas.

Os governos municipal, estadual e federal sempre ignoraram os descamisados, os miseráveis, os sem tetos, os sem letras. Esse é o comportamento dos nossos governantes, procedimento comum em qualquer país do mundo. Há algumas casas antigas que nos fazem voltar ao passado de 40 anos. O prédio da cadeia pública é um desses monumentos.

Mais ou menos no lugar onde está sendo construída uma igreja, havia uma casa e nela morou o professor Antônio Simões, ex-aluno de Academia Militar das Agulhas Negras - AMAN. Um pouco acima se ergue o Instituto Frota Neto. É uma corporação literária que oferece ao cidadão um espaço apropriado ao exercício do conhecimento e de culturas. Reforça, por conseguinte, o interesse dos jovens pelo saber e pela convivência nos meios literários onde quer que estejam.

Avistam-se, em diversos ângulos, modernas moradias recém construídas, um verdadeiro contraste com os casebres do mesmo local. Sem dúvida esse simples morador cederá espaço aos mais aquinhoados e mais uma vez buscará lugar adequado às suas condições financeiras. Formar-se-á entrementes nova periferia e mais uma vez sem infra-estrutura. O próprio homem transforma o meio em que vive e arregimenta responsabilidade do baixo e do alto desenvolvimento. O que era periferia passou a ser área nobre. Isso é bom, porém melhor seria se houvesse um programa de distribuição de renda humanizado.

Diz Plínio Salgado em uma de suas obras: "a cidade tem vida, é dinâmica, socialmente executiva e abrangente, cuida para que as transformações sociais sejam um bem comum".
Quase imperceptível, o crescimento físico da cidade se descortina para o norte, sul, leste e oeste como um invasor indomável. O povo exterioriza com ações suas aspirações que se consubstanciam no imperativo da modernidade, evidenciada pelos interesses comuns.

No bairro do Vamos Ver pude reviver um passado de 45 anos. Parecia um filme! Vendo os locais por onde andei, senti-me como antigamente, de short, descalço e magérrimo, correndo atrás de uma bola em direção ao gol. Que tormento! Machuquei-me de vontade, sorri desvencilhando-me do adulto que mora dentro de mim que não quer ver a velhice em confronto com o passado, muito menos com o presente. Foi ali que passei dias de ouro.

O campo de futebol, onde se jogava uma peladinha, desapareceu e no local nasceram novas residências e conseqüentemente novas famílias, novos jovens e novas esperanças. Custa-me acreditar que se contavam, sem dificuldade, os moradores e as casas. Ruas e ruas dispostamente organizadas esticam-se para um lado e para outro, bairro afora.

Hoje Vamos Ver tem quase tudo que tem uma pequena cidade, como igreja, praça, comércio e vida noturna ativa. O Doutor do Zaca, um flamenguista insuportável, sempre vestido de preto e vermelho, era o juiz das partidas que atraíam centenas de pessoas nos finais de semana. Em qualquer lugar deste País a paixão do brasileiro pelo futebol é uma febre incurável. Até mesmo em Ipueiras, tão pequena e tão distante dos grandes centros, se percebe nas pessoas de todas as idades, essa sede insaciável pelo esporte das multidões.

Ao longo da estrada até a entrada da cidade, espaço outrora das cavalhadas, encontram-se hotel, motel, casas residenciais e lojas de comércio. Até bem pouco tempo nossa gente não conhecia motel, pois só existia em cidades de porte mais elevado como as capitais dos Estados.

À margem desse mesmo trecho da estrada há uma relíquia! A casa de Pedro Malaquias Catunda. Conclamo ao Patrimônio Histórico da cidade, sua preservação, que essa pérola não seja demolida e engolida pelos especuladores imobiliários.

Ela tem vida, é o passado que não pede licença ao presente para se mostrar ao futuro; o visitante ver ao vivo, sem ler, o que aconteceu de mais belo e doce nos anos que se passaram. Estilo barroco, colonial, seja o que for tem que ser conservado uma vez que é o registro da história.
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Foto : cartão postal oficial de Ipueiras
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Nota do blog: depois de uma ausência devida à transferência de Brasília para o Ceará, Luiz Alpiano Viana volta a escrever para o blog Suaveolens, desta vez trazendo um relato crítico e emocionado de recente viagem à Ipueiras. O texto é longo, daí porque o dividimos em dois capítulos. Tomem gosto. Depois vem mais.
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Luiz Alpiano Viana, nascido e criado em Ipueiras, morou mais tarde em Crateús. Atualmente é funcionário aposentado do Banco do Brasil. Morou no Distrito Federal até meados de 2007 quando finalmente voltou a morar no Ceará, em Fortaleza.

3.12.07

ERA UMA VEZ UMA TIMBAUBEIRA

Por
Dalinha Aragão Catunda

Hoje quem sai de Ipueiras e pega a estrada da Floresta rumo aos lugarejos: Chico Pereira e Arroz, não encontra mais a exuberante timbaubeira que encantava os olhos daqueles que por ali passavam.

Bem na encruzilhada, exibindo seu viço, seu verde e seu imenso tronco, o pé de timbaúba viveu por mais de trinta anos até que a fome de um machado inclemente a transformasse em reles troncos jogados ao chão.

Quantas vezes no alpendre da casa grande, que ficava ao lado, deitada numa rede, presenciei o espetáculo divino da lua nascendo por detrás de suas folhagens.Quantas vezes o canto dos pássaros que ali pousavam fazendo seus ninhos, encantaram-me os ouvidos e quantas vezes vi montarias amarradas ao seu tronco, daqueles que por ali passavam para um cafezinho ou um copo d'água.

Só que essa timbaubeira, não nasceu do nada. Não eclodiu, não brotou sozinha. Não. Essa timbaubeira foi uma mudinha, plantada por um menino chamado Vilmar, num chão duro, seco, terra de barro vermelho onde a difícil brotação é uma verdade.

Esse mesmo menino, muito jovem mudou-se para Brasília. Entre trancos e barrancos, na dureza de um chão vermelho, também plantou sua vida. E, apesar dos golpes do destino, consegui colher frutos maravilhosos que hoje dão sabor e sentido a sua existência.

Cada vez que ele voltava a sua terra sentia orgulho de sua façanha. Aquela árvore ali plantada, era a prova viva da resistência do nordestino, que sobrevive a calamidade das secas e consegue fazer ninhos em outras paragens sem esquecer suas raízes. Ali, ele, estava plantado, ali, ele escrevera sua história, que hoje contará picotada a seus filhos.

No último janeiro Vilmar viu sua árvore alegre e fagueira brincando ao vento, outros janeiros certamente virão, mas o pé de Timbaúba, marco em sua vida, virá apenas na lembrança.

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Foto do Vilmar, residente em Brasília: acervo do blog Suaveolens
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NOTA DO BLOG: depois de um acidente com um raio que nos queimou o computador, estamos reiniciando as operações com esta bela crônica de Dalinha Catunda._________________________________________
Maria de Lourdes Aragão Catunda – POETISA, ESCRITORA E CORDELISTA. Nascida e criada em Ipueiras-CE, conhecida popularmente como Dalinha Catunda, vive atualmente no Rio de Janeiro. Publica nos jornais "Diário do Nordeste" e "O Povo", nas revistas "Cidade Universidade" e "Municípios" e nos blogs: Primeira Coluna, Ipueiras e Ethos-Paidéia. É co-gestora convidada do blog Suaveolens, além de ter blog próprio: