MINHA IPUEIRAS QUERIDA
Francisco Assis Martins Fernandes
Foi lá na Serra da Ibiapaba que nasci. O primogênito de muitos irmãos. Botei os pés em Ipueiras pelos idos de 1946. O sonho dos estudos era maior do que eu. Naquele tempo minha mãe já me ensinara o ABC. Consegui, com meu primo Crispim, uma Cartilha. Foi um momento de alegria e de esperanças. De sonhos de futuro.
Vendo meu entusiasmo pelas Letras, meu pai permitiu que eu fosse estudar em Ipueiras. Fiquei na casa de um primo, o Chico Bilina, na Estação. A primeira professora foi dona Colú. Ficou minha amiga. Até arranjou uns livros para eu ler. A vida era muito dura. A festa da Imaculada era um momento de alegria. Encontrava meus parentes do Ipuzinho, da Gázea, do Buriti, da Matriz de São Gonçalo e da Boa Vista.
Meu tinha grandes amigos em Ipueiras. Entre eles lembro-me do sr. Sebastião Mattos, Raimundo Aragão, Pedro Aragão, Raul Catunda, Idálio Frota, seu Guarani, Edmundo Medeiros, Wencery de Souza, Costa Mattos, Sebastião Mattos Sobrinho, padre Francisco Correia Lima e muitos outros.
Dona Colú achou que eu já era capaz de ir para o curso mais avançado. Ela mesma de indicou para a professora Isa Catunda. Era simpática. Tinha uma caligrafia muito bonita. Ao final do ano, ela me disse: Você precisa de uma escola mais elevada... De tanto insistir, meu pai que era amigo dos Mourões, colocou-me na Escola de Dona Esther Mello Mourão. Ela tinha a fama de ser bravíssima.
Comecei os estudos. Fui morar na casa do sr. Gonçalo de Araújo Lima. Dedicava-me aos estudos de Matemática, Geografia, Português e História. Dona Esther não permitia brincadeira. Ali tinha colegas como filhos do sr. Idálio Frota, dos Pinhos. Nas aulas de matemática, vi a palmatória tinir nas mãos de muitos, inclusive das meninas. Era terrível, pois ela perguntava a tabuada, exemplo 17x1, vezes 2... vezes 9. Quem não soubesse esperava a palmatória daquele que acertasse. Muita gente apanhava. Muitos ficavam as duas horas de aula ajoelhados... de castigo. O sonho era ir para outra Escola.
Eu lamentava aquelas aulas de “terror”. Fui apresentado para o diretor do Educandário N. S. da Conceição: prof. Sebastião Mattos Sobrinho, conhecido por Nenê Mattos. Ela trabalhava com o seu tio Sebastião Mattos. Sua esposa, dona Mundita, era professora. Viera de Fortaleza. Gostava muito de bandolim. Quando sobrava um tempinho, ela tocava. Eu ficava encantado. Tinham um filho, o Jean Kleber, que ficou meu amigo-irmão. Um garoto que trabalhava com eles era o Zaca (Zacarias). Conhecendo minha situação, ofereceram a meu pai, a residência e as aulas no próprio colégio. Havia também a Maria José que ajudava na limpeza da escola. Eu admirava a biblioteca do sr. Mattos. Ele possuía um Rádio que sintonizava a BBC de Londres. Eu ficava a seu lado ouvindo as notícias.
Naquele tempo tive que comprar um uniforme do colégio. O Jean era pequeno. Dava os primeiros passos nos estudos. No Educandário N. S. da Conceição estudavam os filhos da mais alta sociedade ipueirense. Sete de setembro era marcado pela “Parada”. Tínhamos que marchar.
À noite, era interessante um passeio pela Praça Getúlio Vargas. As meninas observavam os meninos e vice-versa. Os filhos de Pedro Aragão, Idálio Frota, Raul Catunda, Gonçalo Ximenes, dos Pinhos, dos Souza, dos Moreira. Mas o tempo foi passando. Alguns partiam para estudar em Fortaleza e até no Rio de Janeiro.
Foi uma dessas ocasiões que meus “mecenas” resolveram deixar Ipueiras. Optaram por Fortaleza. Eu andava triste por ter que voltar para a Serra. Meu pai já me dizia: “Agora, filho, já sabe ler, escrever, contar. É hora de me ajudar a criar o resto da família”. Sr. Mattos e dona Mundita, vendo os meus sonhos caírem por terra, me convidaram para ir com eles para a Capital. Lá eu tinha dois caminhos: ou ingressar no Exército ou num Instituto Religioso, que tinha uma gráfica. Sr. Mattos chegou a levar-me ao seu amigo Capitão Bandeira na 10ª Região Militar. Depois de falar comigo, aconselhou-me a pedir dispensa do Serviço Militar. Foi o que fiz. Depois de uma semana estava eu no Instituto da Pia Sociedade de São Paulo, na Rua Barão do Rio Branco.
Lembro-me com saudade de MINHA IPUEIRAS QUERIDA! “Ó tempora, ó mores!”. Hoje, distante no tempo e no espaço, posso parafrasear o poeta e dizer:
Da aurora de minha vida,
De minha Ipueiras querida,
Que os anos não trazem mais...
3 Comentários:
Francisco Assis Martins Fernandes é mais um egresso de Ipueiras que ganhou o mundo para construir-se. Publicar sua crônica foi para mim uma honra. Convivemos sob o mesmo teto escolar na velha Ipueiras e preservamos nossa amizade com a inspiração do Eclesiástico (6, 14):“Um amigo fiel é uma poderosa proteção, quem o achou, descobriu um tesouro.”
Mais um ipueirense ilustre que nos honra com seu invejável currículo. Não foi à toa que escrevi: IPUEIRAS É ASSIM... Onde quer que estejam teus filhos, honras te prestarão, Ipueiras!
Gostaria de saber, Jean Kleber, se o ilustre conterrâneo é filho de José Fernandes, lá de cima da Serra (Lagoa), o homem de centenas de afilhados.
Caro Alpiano, Assis é filho de José Fernandes, da Serra. É irmão de Marcelina, Sebastião, Miguel, Odon...
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