Suaveolens

Este blog foi criado por um cearense apaixonado por plantas medicinais e por sua terra natal. O título Suaveolens é uma homenagem a Hyptis suaveolens uma planta medicinal e cheirosa chamada Bamburral no Ceará, e Hortelã do Mato em Brasília. Consultora Técnica: VANESSA DA SILVA MATTOS

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Local: Brasília, Distrito Federal, Brazil

Cearense, nascido em Fortaleza, no Ceará. Criado em Ipueiras, no mesmo estado até os oito anos. Foi universitário de agronomia em Fortaleza e em Recife. Formou-se em Pernambuco, na Universidade Rural. Obteve o título de Mestre em Microbiologia dos Solos pelo Instituto de Micologia da Universidade Federal de Pernambuco. Também obteve o Mestrado e o Doutorado em Fitopatologia pela Universidade de Brasília. Atualmente é pesquisador colaborador da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília.

20.4.13

ESTE É O MEU SERTÃO



ESTE É MEU SERTÃO!
Por
Dalinha Catunda
*
Lá no meu sertão
Na casa singela
De ferro a panela
De lenha o fogão
Como capitão
Na mão amassado
Costume passado
Que o povo detinha
Feijão com farinha
Na mão abolado.
*
Lá na minha oca
Casa de sapé
Eu tomo café
É com tapioca
Ou com mandioca
Cozida com sal
Adoro um curral
E leite mungido
E o cheiro sentido
Não há outro igual
*
Deitada na rede
Me embalo ditosa
Que vida gostosa
Com pé na parede
Aqui minha sede
Alguém vem matar
Nós dois ao luar
E a brisa da noite
Num leve açoite
Vem nos refrescar.
*
A lua faceira
Quando fica cheia
Meu rancho clareia
Eu toda lampeira
Com a cabroeira
Faço cantoria
Só vendo alegria
Neste meu rincão
É este o sertão
Que me contagia.
*
Texto e foto de Dalinha Catunda

Maria de Lourdes Aragão Catunda – Poetisa, Escritora e Cordelista. Nascida e criada em Ipueiras-CE, conhecida popularmente como Dalinha Catunda, vive atualmente no Rio de Janeiro. Publica nos jornais "Diário do Nordeste" e "O Povo", nas revistas "Cidade Universidade" e "Municípios" e nos blogs: Primeira Coluna, Ipueiras e Ethos-Paidéia. É membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel. É co-gestora convidada do blog Suaveolens, além de ter blog próprio: (cantinhodadalinha.blogspot).

SEU MUNDO RICARDINO


"Seu Mundo Ricardino" - Por Walmir Rosa de Sousa

Esta crônica foi publicada originalmente no blog primeiracoluna.blospot.com.br em 13 de abril de 2005 por Carlos Moreira


Passada a primeira infância, em que a moda, na época, eram grandes cachos de cabelos (talvez uma influência tardia da moda francesa imortalizada pelos Reis de França, de Luís XIII a XVI), fui levado por meu pai, Wencery, à Barbearia do Seu Mundo Ricardino, que ficava ali vizinho à casa do Seu Luís Malaquias, defronte à Padaria do Mestre Laurindo, para fazer um corte à moda Príncipe de Gales (corte militar, de influência britânica).

Seu Raimundo Ricardino, ou "Seu Mundo", como todos o conheciam, um homem alto, ereto, cabelos de corte militar, à máquina, vendo meu diminuto tamanho, colocou sobre a cadeira um banquinho de madeira para que eu alcançasse altura suficiente para dar acesso à tesoura e à maquina. Senti um estranho poder naquele homem; de um momento a outro, de um bebê me transformou num homem. A partir daí, passei a admirá-lo e a observá-lo.

Seu Raimundo Ricardino em ação (foto - acervo pessoal de Edson Morais)

Nas minhas andanças de menino de cidade do interior, fuçava, juntamente com os colegas (dos quais, em futuro, pretendo falar) todos os recantos da urbe (cidade grande tem que ser chamada assim - em latim) e vi que Seu Mundo também tinha outra habilidade: tocava tuba na Banda de Música da Paróquia, que animava todas as festividades religiosas da terra (quem não se lembra dos dobrados na calçada da igreja e dos curtos acordes depois de cada arremate nos leilões beneficentes na Festa da Padroeira?).

Fiquei freguês. Por morar perto, muitas madrugadas corria para o quartinho da Banda para, com outros meninos, acompanha-la até o patamar da Igreja onde, depois da missa, havia uma retreta (para os mais novos, concerto de uma banda de música em praça pública). E ele lá estava com sua tuba, juntamente com Seu Catunda, no bombardino; Tunga, no bumbo; Antônio Jardelino, no trombone, e outros de cujo nome não lembro (me desculpem) executando seus respectivos instrumentos.

Seu Mundo era o maior de todos e tocava o instrumento maior. Tinha tudo a ver com "mundo". E aquele grande homem não era só isso, não. Nas noites ipueirenses comandava o "espetáculo da luz". Era ele, e só ele, quem iluminava a cidade, por ser o encarregado pelo funcionamento e manutenção do "Motor da Luz" (era assim que toda a gente chamava), e todas as noites, com seu enorme e estranho poder, mandava todos dormir, ao "dar sinal" de que, em meia hora, iria desligar a luz.

Até hoje, no meu pensar, tenho plena convicção de que SEU MUNDO ERA O HOMEM DE MAIOR PODER EM IPUEIRAS, pois, homem de muitas habilidades, transformava crianças em homens, com um simples corte de cabelo, tinha o poder supremo de acordar a cidade com as alvoradas da Banda e, ao fim do dia, dava o toque de recolher, ao apagar a luz, mandando todos dormir. Como não tinha instrução suficiente para compreender que "mundo" era um apelido derivado de "Raimundo", seu nome, achava que "mundo" era por conta de seu poder. Quase "Dono do Mundo".

"Seu Mundo Ricardino", no lugar onde estiver, representado por seus familiares, merece receber, de toda a comunidade, a homenagem de figurar no rol das Personalidades Ipueirenses, pelos relevantes e inolvidáveis serviços prestados à nossa terra. *PC*

Walmir Rosa de Sousa, é ipueirense e procurador de justiça no Estado do Ceará além de grande cronista da cidade de Ipueiras. Este é um currículum provisório, devendo ser complementado oportunamente para uma adequada apresentação.



13.4.13

MONTE CASTELO EM QUATRO VENTOS



Por Raymundo Netto
¹ A denominação de “Monte Castelo” remonta da famosa batalha, e o bairro a recebeu em 15 de junho de 1945.

² João de Pontes Medeiros, português, importante nome da história da telefonia, do transporte público e da saúde no Ceará, antigo proprietário das terras que, aos poucos, foram se desenhando em bairro.

1971. Meu pai de cinco filhos, num jeep velho, levava a família à casa nova, no Monte Castelo¹, antigo bairro do açude João Lopes. Lembro de ele trazer-me, menino, nos braços, à beira da pracinha redonda, a João Pontes² . Para mim, no tempo, aquela era enorme, encantada por brinquedos de ferro: gangorra, balanço, macaca, escorregador... Perguntei, com lustro infante: “Papai, tudo isso é nosso?” “Tudo”, deu por certo.

A praça tinha, por coração, imenso chafariz de azuis lejos, vestido de pedras de cores, as mesmas dalgumas paredes do entorno, a estrelejar. Abraçava-o dupla escadaria e “palco” em mosaico de fragmentos de cerâmicas sanguíneas. Árvores sombrejavam trechos de brancos e róseos quartzos a gravurar estrelas, luas e jangadas pretas. Eram nela feirinhas das flores, comícios, a chegança alegre do parque São Luiz, o repouso do maracatu, as peladas na areia branca, as paqueras com a moçada da Villa Cysne, os afetos sob copas verdes a filtrarem pálida iluminação dos postes, ou as conversas demorosas em bancos de cimento — as traves dos futebóis — ao estalar dos carrinhos de pipoca, ou à chiadeira alegre dos de algodão doce, servido assanhado em papel de enrolar pão. Onde se via meninos correrem atrás do triângulo tilitante da chegadinha, do sino dos picolés, ou o pouso breve dos alunos do curso de datilografia do Círculo Operário e dos misseiros dominicais da Senhor do Bonfim. Ali, em dias, rapazes em tamancos duelavam com arraias de corpo delgado em cerol; em noites, grupos saíam, nas madrugais de reisado. Em chuvas, mocinhas a chutar águas em busca de bicas tiritantes. À frente, no Clube Internacional, bailinhos de carnaval para crianças, quadrilhas juninas e encontros festivos. Depois, a receber as pancadas do “Agito Jovem”, forrós e festas punks — em jaquetas pretas, envoltos em correntes, cabeças de têmporas raspadas, tatuagens e botas, a chutar, cobertos de lua, os sacos de lixos das calçadas.


Alvorecia no varrer de ruas. Peixeiros pregoavam, assim como leiteiros, vendedores de legumes e de limões. De graça, só risos a freguesas, as mesmas a trazerem às axilas a caderneta de fiado da Casa Ceará e das bodegas de pão sovado, dim-dim, café torrado e embalado, na hora, em sacos de papel. Vinham na pressa do vagar de chinelas, ao som da passarinhada do capitão Costa a animar manhãs frescas de castanholeiras e jambolanas perseguidas a pedras por moleques gazeteiros da Santa Edwirges. Ou, no domingo, em filas imensas, no abate do frango na hora, da d. Vanda. Nas vesperais, eram de se cumprimentar rodas de calçadas, onde vizinhos — todos tinham nomes — se reuniam, por motivos fossem: conversa a jogar fora, fofocaria, a “chuva de sabão” na rua da Siqueira Gurgel, ou para a torcida do futebol gritado no radinho de pilha. Por muros baixos, uns chamavam os outros, das televisões em preto e branco, a lagrimarem por Selva de Pedra e Escrava Isaura. Das ruas, por bom tempo de pedras toscas, acenavam ao Samuel, motorista das linhas “Monte Castelo” e “Conrado Cabral”.


Às noites, jovens abriam as portas de casa de piso encerado, de luzes penduradas no teto, a receber amigos, amigos de amigos e completos desconhecidos em “sons”, onde vendiam caipirinhas, rifas e bingos, e ensaiavam melosas histórias de amor. Moradores até da vaidosa Aldeota encontravam-se no Real Drinks, em serestas do Steak House, na sorveteria Sibéria — a comemorar a estampa de Novinha, filha do bairro, rainha do carnaval, em capa de jornal — ou amanheciam de noites compridas na churrascaria Alikate.


Muros hoje cresceram. Pessoas entram e saem silenciosas, anônimas. Multiplicam-se invasões e medos da desigualdade, afastando os bem-te-vis, papa-arrozes e lavandeiras. Não fossem churrascarias, bares e barulhos da avenida, seríamos desertos. Na pracinha caduca, apenas acácias enrugadas e escuras, a respirar saudades de tempos idos, as crianças nos pula-pulas e o último pipoqueiro, chorando silencioso, em sal e manteiga, o que rexiste.


RAYMUNDO NETO


Caminhante por convicção. Escreveu Um Conto no Passado: cadeiras na calçada, romance premiado pela Secretaria da Cultura. É autor de Os Acangapebas, contos, premiado pela Academia Cearense de Letras, e de três infantojuvenis.

10.4.13

ELE ADORA COMER MARIA


*
Por
Dalinha Catunda 
*
A Maria é seu chamego
Desde que era criança
Desde novo ele comia
Afirmava a vizinhança
Falando mal do seu vício
Que hoje virou lambança.
*
Quando chega do trabalho
Chega cheio de euforia
Vai direto pra cozinha
Pensando em comer Maria
Se não comer não sossega
Até perde a alegria.
*
Come na boca da noite
E come ao raiar do dia
Briga com todo mundo
Caso não ache Maria
Quando acha se empanturra
E sua fome sacia.
*
Quando ele cai de boca
Acaba com a Maria
Quem desejava comer
Aquilo que apetecia
Dando meia volta sai
Frustrado se contraria.
*
Um dia tasquei a boca
Provei, mas que beleza!
A danada era gostosa
Maria da Fortaleza...
Bolacha de qualidade
Que o Ceará tem na mesa.


Texto: Dalinha Catunda
Imagem pescada na internet 

Maria de Lourdes Aragão Catunda – Poetisa, Escritora e Cordelista. Nascida e criada em Ipueiras-CE, conhecida popularmente como Dalinha Catunda, vive atualmente no Rio de Janeiro. Publica nos jornais "Diário do Nordeste" e "O Povo", nas revistas "Cidade Universidade" e "Municípios" e nos blogs: Primeira Coluna, Ipueiras e Ethos-Paidéia. É membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel. É co-gestora convidada do blog Suaveolens, além de ter blog próprio: (cantinhodadalinha.blogspot).