VAI PASSAR
O fato nos chama à reflexão. Por todo o País, toca-nos o apelo do "todos pela educação de qualidade para todos". Mas é o "todos" - ponto-de-partida e destino - que parece mais envolver-nos, fazendo-nos passar por cima da qualidade, atropelando-a até.
Nesse clima, o verbo "passar" e seus cognatos tornam-se palavras-de-ordem. A escola se vê como mera passagem, onde crianças se abrigam, em stand by para a vida. A educação não mais "processo formativo" (Art. 1º. da LDB), mas, ao invés, inoperante impressão de folhas em branco. E o ensino, por vezes, a tentativa de "segurar" os alunos pela ação de bem-intencionadas figuras que, na prática, se tomam caricatas "seduções do passar": - organização curricular em ciclos (por mais amplos) do período escolar, classes de aceleração da aprendizagem, sistema de promoção automática e avaliação mais abrangente.
Entre pais menos letrados, a reação similar à de Bernadete, que, sem rodeios e em seu dialeto, reclama-me, ao me pôr à mesa o café-da-manhã, sobre o tratamento dado ao filho na escola: "0 Robson vai passar! É "cicIo", "aceleração não sei de que", "satisfatório/não satisfatório" ... Ele não sabe de nada (estou lhe avisando!) e,assim mesmo, vai passar". E, num sorriso de canto de boca, destila: "Estão dizendo que é o Governo e até o senhor que querem assim ..."
Nas oposições mais letradas, o tom não é diferente. O combate à evasão escolar estaria se fazendo a qualquer preço, os olhos fitos sobretudo no ilusionismo das estatísticas e no fulgor dos out doors.
Paixões a parte, sejamos sensatos. Elogios sim a "todos", ativos e passivos, no afã de universalizar o ensino. Mas, aos que pecam pelo açodar-se, o conselho do Pe. Sadoc, honorário membro do CEC: "É o freio e não o acelerador que põe o carro para correr". No caso, é conjugar freio e acelerador. Pé no chão, "na tábua" e no "breque", sem, no entanto, perder de vista a estrada e, sobretudo, a chegada. Educação é meio, não fim. Seu porto, a inclusão social, a cidadania e a construção econômica da vida, onde títulos sem crédito e cheques sem fundo não têm valor.
Sem lastro, é desperdício. Onda! Vai passar!...
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4 Comentários:
Escrito em 2000, oito anos passados, este artigo de Marcondes Rosa de Sousa apresenta inquestionável atualidade tendo-se em vista as questões da educação no Brasil de hoje."Educação é meio, não fim. Seu porto, a inclusão social, a cidadania e a construção econômica da vida, onde títulos sem crédito e cheques sem fundo não têm valor".É isso aí. Parabéns, mestre!
Excelente. Infelizmente este artigo continua atual, nada mudou, talvez tenha piorado em alguns aspectos. Educação de qualidade ainda é um sonho... distante! Abraços.
O texto retrata a sobriedade e ampla visão crítica que um mestre da educação como Sr. Marcondes Rosa tem pelo atual ensino no nosso país. Muito deve-se mudar, e a mudança é gestada neste e em outros trabalhos do gênero que nos fazem refletir e depois agir.
Marcondes Rosa, é uma voz que desde sempre clama por melhores dias no ensino. Critica, aponta caminhos, mas carece de outras vozes que unidas a sua poderão fazer acontecer o milagre do ensino responsavél, onde os direitos e deveres de alunos e professores falem mais alto que os interesses do governo.
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