Suaveolens

Este blog foi criado por um cearense apaixonado por plantas medicinais e por sua terra natal. O título Suaveolens é uma homenagem a Hyptis suaveolens uma planta medicinal e cheirosa chamada Bamburral no Ceará, e Hortelã do Mato em Brasília. Consultora Técnica: VANESSA DA SILVA MATTOS

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Local: Brasília, Distrito Federal, Brazil

Cearense, nascido em Fortaleza, no Ceará. Criado em Ipueiras, no mesmo estado até os oito anos. Foi universitário de agronomia em Fortaleza e em Recife. Formou-se em Pernambuco, na Universidade Rural. Obteve o título de Mestre em Microbiologia dos Solos pelo Instituto de Micologia da Universidade Federal de Pernambuco. Também obteve o Mestrado e o Doutorado em Fitopatologia pela Universidade de Brasília. Atualmente é pesquisador colaborador da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília.

1.5.07

NOTÍCIAS DAS DUAS CARNAUBEIRAS


Por
Jean Kleber Mattos

Fins dos anos quarenta. A linha da minha arraia enroscou-se numa jovem carnaubeira que existia em frente à Coletoria de “seu” Juarez Catunda, na Praça da Matriz. Morávamos por lá, como primeiro domicilio em Ipueiras.

As carnaubeiras jovens são atarracadas e agressivas, muito espinhentas. Os pecíolos das folhas são muito adensados impedindo a escalada. As carnaubeiras velhas são altas e esguias. Elegantes mesmo. E não são agressivas. Dá para escalar.

Chapéus, cestas, bolsas, cobertura de casa, caibros, vigas, quase tudo pode ser feito com partes dessa planta. Sem falar na famosa cera da palha que já foi importante produto de exportação.Terra de artistas, a palhinha do Domingo de Ramos quase sempre se transformava numa singela cruz e, às vezes, num artefato mais elaborado, nas mãos habilidosas dos fiéis.

E quem não cavalgou em cavalinhos feitos com o pecíolo da folha da carnaubeira? Nele esculpiam-se orelhinhas e a própria palha, na extremidade, figurava como cauda.

A polpa do fruto maduro da carnaubeira, pretinho, é uma delícia.

Mais tarde, anos 50, mudando de casa, eu viria a conhecer duas imponentes e queridas carnaubeiras maduras. Ficavam perto de minha casa, o Educandário, na antiga Praça Getúlio Vargas. Uma quase em frente à pensão de seu Meton e outra no lado oposto ao bar de seu Guarani, perto da casa de seu Abdul, quase de frente para a casa de D. Laura Moreira.

Elas situavam-se praticamente no meio da rua. Ninguém, contudo, imaginava viver sem elas. Uma delas, a de seu Meton, eu costumava visitar. Punha um chapéu tirolês que meu pai me dera e, quando minha mãe me perguntava onde eu estava indo, eu respondia: “para o escritório”.

Desta forma cumpria eu a trajetória de toda criança, tentando imitar o pai. Meu pai punha um chapéu de massa quando ia “ao escritório”, no outro lado da praça, ou seja, quando ia fazer a contabilidade da firma do Tim Mourão e da firma do tio dele, Sebastião Matos.

Recentemente, passadas décadas, almoçando em Fortaleza com os Rosa de Sousa, Marcondes e Walmir, na casa de sua irmã Solange e recém chegado de Ipueiras, respondo ao Walmir que perguntou-me pelo destino das duas carnaubeiras.
-Não sei como se deu. Só sei que não estão mais lá.

Foi lendo a primorosa crônica “SAUDADE”, do ipueirense Luiz Alpiano Viana, publicada no blog Suaveolens, que terminei sabendo de toda a história. Reproduzo aqui o texto daquele autor:
“Assisti à derrubada das carnaúbas do centro da cidade. Vi Jeremias clamar para elas permanecerem de pé, mas o progresso falou mais alto e o machado impiedosamente venceu. À noite, na Rádio Vale do Jatobá, Jeremias lia uma crônica que dava por encerrada a época dos meninos que cavalgavam num talo de carnaúba. Como ele, eu também cavalguei num alazão, um ginete por todos admirado, com uma calda bem cuidada, ao estilo manga larga”.

Eu não imaginava a dor que tinha sido para os históricos da cidade despedir-se daquela parte do patrimônio natural que marcara nossa infância.

Meu tempo longe de Ipueiras privara-me de convivência solidária com os amigos que lá ficaram. A luta por um lugar ao sol neste mundo de meu Deus, por vezes nos leva embora dos sítios onde se forjou parte importante de nosso caráter. E nos torna ausente de todas as lutas e dores que lá se deram no transcorrer dos anos.

É uma sensação de perda difícil de descrever.
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Foto: As duas carnaubeiras fotografadas ao final dos anos 40. Ao fundo, o morro, com o Cristo no alto.
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Jean Kleber de Abreu Mattos, cearense, nascido em Fortaleza, viveu em Ipueiras dos dois aos oito anos de idade. Foi universitário de agronomia em Fortaleza e em Recife. Formou-se em Pernambuco. Atualmente é professor da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília.

3 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Jean, acho que não só vcs os meninos como as meninas também sentiram falta delas. Em frente de minha casa tinha uma,onde outro dia estando a ver as fotos de minha infancia e adolecencia encontrei uma, onde estava abraçada a velha carnaubeira e me veio um pensamento. Quem sabe, através de seu blog ou do grupo ips, podiamos solicitar aos conterraneos, que se tivessem fotos ao lado das carnaubeiras, que enviassem a vc. O que acha?
Forte abraço,
Tereza Mourão

1.5.07  
Anonymous Anônimo disse...

Grande idéia, Tereza. Vamos pedir.

2.5.07  
Anonymous Anônimo disse...

É Jean Kleber,
das velhas carnaubeiras, ficaram fotos e histórias. Meninos e meninas, montaram no tal cavalinho de pau feito do talo da carnauba,comer carnauba pretinha ao pé da árvore, também não escapei. Minha casa ficava entre duas carnaubeiras. A mais famosa pertinho do arco de Nossa Senhora, bem no meio da rua, e a outra, em frente a casa do Zé Maria do Claudio Catunda. Preservar não é palavra bem aceita no dicionário de nossa terra. Acaba-se com as árvores nativas, muda-se nome de praças e ruas e assim segue o processo de descaracterização da nossa Ipueiras.

2.5.07  

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