Por
Bérgson Frota
O povo nordestino tem certas peculiaridades que o distinguem dos de outras regiões brasileiras. São tradições e costumes que o pintam de maneira singular.
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Quando criança, comecei a ouvir lá no meu interior, histórias de descobridores de botijas, era o tempo das botijas que creio eu ainda não findou-se. Contavam os mais velhos que nos séculos XVIII, XIX e ainda quase metade do século XX.
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O povo do interior costumava guardar suas moedas de ouro, prata e cobre escondidos em latas de metal onde podiam ser conservadas ou em baús revestidos de chapa de metal e enterrados.
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O lugar era marcado por pedras, acidentes geográficos ou embaixo de grandes e velhas árvores. As latas eram colocadas nas paredes grossas das casas e os baús, longe, como já dito fora delas. O costume se fazia pela falta de bancos, pelo medo do roubo e por não ter com que gastar o muito lucrado.
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Sertanejos faziam quase tudo, e se às vezes tinham o que comprar, guardavam uma minguada economia que sobrava sempre e assim se mantinham. Em Ipueiras, foram encontradas várias botijas no correr de sua história, a mais recente na década de 1970.
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O descobridor derrubando as paredes de uma antiga casa encontrou socado numa grossa parede de canto uma lata, cheia de moedas de prata e ouro, não se sabe o valor, o certo é que silenciosamente em pouco tempo mudou-se com a família para uma capital do sudeste e só depois por parentes se soube do fato.
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Contornando o morro do Cristo, em Ipueiras , se via no caminho serpenteado, covas quadradas na medida de um grande ou médio baú, quase a beira da estrada carroçal. Não havia dúvida, e isso era fato corrente daquela região, muitas botijas foram certamente achadas. Dizem os mais velhos que às vezes o felizardo sonhava com o lugar, ou por pura sorte cavando encontrava.
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Para completar o quadro,era corrente a história de que ao cavar o astuto e ambicioso tinha visões macabras, como fogo queimando o corpo, cobras se enroscando nas penas e espíritos penados a mandar que parasse a escavação.
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O certo era que das histórias que ouvi muitos fugiram e se desequilibraram mentalmente, outros mais corajosos iam até o fim, e bastava abrir o baú de madeira carcomida, tudo sumia com um gemido medonho. O que levava estas botijas a serem esquecidas era ou a morte repentina do dono, e só ele sabia onde estava, ou pela idade o esquecimento que lhe fazia procurar e não mais achar o lugar correto.
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Outro fato era o sonho do lugar da botija, dizia-se que o espírito não teria paz enquanto não revelasse o segredo, o dinheiro que em vida não usufruiu, que o ouro e a prata o prendiam no lugar. Verdadeiro ou falso, muitos descobriram esses tesouros, e formou-se lenda no sertão, dinheiro não gasto traz a perdição do falecido. O tempo das botijas passou.
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Mas quem pode afirmar quantas ainda estão a esperar o seu descobridor. Com modernos aparelhos a detectar metais, um corajoso aventureiro não há de voltar de mãos vazias, ficando rico da noite para o dia e finalmente libertando o espírito de quem a enterrou.
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Crédito da imagem 1 : ultkm.blogspot.com
Crédito da imagem 2: fuleiragem.typepad.com/fuleira/2008/05/eu-me-amarro-em.html
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Bérgson Frota, escritor, contista e cronista, é formado em Direito (UNIFOR), Filosofia-Licenciatura (UECE) e Especialista em Metodologia do Ensino Médio e Fundamental (UVA), tem colaborado com os jornais O Povo e Diário do Nordeste, desenvolvendo um trabalho por ele descrito de resgate da memória cultural e produzindo artigos de relevância atual.
9 Comentários:
Mais uma excelente contribuição do cronista e pesquisador Bérgson Frota, desta vez abordando um tema curioso ligado à cultura nordestina e que estimula o imaginário de crianças e adultos. Obrigado professor!
Um artigo bom de se ler, na verdade já tinha ouvido muitas histórias no meu interior deste potes de moedas, daqui uns tempos quando esse descobridor de metal baratear vou procurar botijas, seguido a dica do autor.
Gonçalo Melo Miranda - que há pouco tempo foi homenageado nesse blog - arrancou umas duas botijas e está vivinho para confirmar essa estória.
Bérgson abordou um tema que será sempre interessante e que muito escutei nas histórias de calçadas.
Um abraço,
Dalinha
Uma crônica nota dez amigo, continue a escrever e nos presenciar com a riqueza da sua narrativa. Quem me dera também achar uma botija ! Rs, rs, rs.
Parabenizo o cronista pelo trabalho, infelizmente o tema das botijas enterradas é pouco divulgado aqui na mídia cearense, concordo também que há muitas botijas a serem encontradas e muitas almas a serem libertadas,rs,rs,rs.
Muito boa a crônica! Parabéns!!!
Em Ipueiras ouvi dos mais idosos que o Sr. Gonçalo Miranda arrancou algumas botijas, e que era especialista nisso. Será mesmo verdade?
Abraço a todos!
Luiz Fernando Pontes de Sousa
Olá sou nordestino,nasci em pernambuco e goste de ler este artigo.sou bisneto do coronel joaquim martins de Bezerros-PE,ele enterro muitas butijas em potes de barro,meu avó(filho dele) falava que com a idade avançada (93 anos)o velho joaquim perdeu a menmoria e não sabia mais onde enterro as botijas,ficava escavando por toda parte e não encontro mais.joaquim martins dissia que ¨de riacho das almas ao sitio dos remèdios seu gado andava pisando em ouro e prata¨.Difato até hoje na antiga sede da fazenda dele se ouve gemidos assustadores do velho coronel,sua alma ainda não repoasa em paz.
sei muitas histórias de butijas,lendas e etc...penso em fezer pequenos levros enlustrados para crianças oque me falta é verba.kkkkkkk
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