Por
Jean Kleber Mattos
O que uma pessoa iluminada? São iluminados Ghandi? Einstein? Madre Tereza
de Calcutá? Martin Luther King? Madre Paulina? Claro que sim. Seus feitos em
prol da paz e do progresso da humanidade são incontestes.
Certa vez, durante uma reunião da comunidade universitária da qual eu
participava, discutia-se os rumos de uma greve. Em determinado momento um aluno
pediu a palavra e pediu aos professores presentes que esclarecessem um ponto
obscuro qualquer, não me lembro bem qual. Não sem certa ironia, disse que
aguardava o esclarecimento pois era um aluno, o que significa não iluminado (alumni).
Cada um de nós obviamente tem a sua lista de iluminados. Não se trata de
santos nem de grandes líderes carismáticos ou cientistas da estatura de
Einstein. No entanto foram pessoas capazes de nos encantar e merecer nossa
admiração e amizade pelo idealismo, dedicação, honestidade, bom humor e outras
tantas qualidades. Também tenho minha lista. Eles vão ser referidos à medida em
que segue a narrativa.
Corria o ano de 1979. Uma estudante de meu departamento de nome Maria das Graças, uma mineira, procurou-me
para que eu a orientasse em um trabalho final do curso de agronomia. O assunto
era Plantas Medicinais. Disse-lhe na ocasião que era um assunto que eu não
conhecia muito embora gostasse muito dele.
Àquela época eu era apenas mais um ignorante em plantas medicinais. Como
ela insistiu em cultivar as plantas medicinais, sugeri que ela trouxesse alguém
com conhecimento ancestral para nos ajudar a formar uma coleção das tais
plantas. Ela trouxe a própria avó. Deu certo. Formamos uma boa coleção,
estabelecendo, não sem dificuldades, a classificação botânica da maioria das
plantas que aquela senhora referia pelo nome popular. Este foi o começo da minha
saga.
Depois de algum tempo em
que a coleção fazia a delícia dos alunos que gostavam daquela matéria, apareceu
em Brasília uma equipe da Rede Globo objetivando realizar uma reportagem sobre
plantas medicinais.
Era o jornalista Hamilton Ribeiro
que trazia uma recomendação de um colega meu da Paraíba, o farmacêutico José Maria o qual, por ocasião de uma
viagem à Brasília, havia conhecido a nossa coleção. A reportagem foi ao ar no
GLOBO RURAL mostrando a nossa coleção e as atividades da firma FARMACOTÉCNICA,
que à época era a única firma genuinamente Brasiliense a investir em
fitoterapia, com produção própria em um núcleo rural da região. Veículo
poderoso, a televisão. Recebemos cerca de 15.000 cartas. O anonimato tornara-se
impossível.
A firma FARMACOTÉCNICA, fundada pelo farmacêutico catarinense Rogério Tokarski, desenvolvia em
Brasília uma linha de farmácia magistral com plantas medicinais. Ainda hoje é,
para nós, a grande referência por aqui.
Pouco tempo depois que a reportagem foi ao ar, um estudante trouxe-me
algumas plantas para que eu verificasse a classificação botânica feita por
alguns amigos dele. Ele vinha de Recife. As plantas pertenciam a um horto
localizado em Olinda. Falou-me do pessoal que lá trabalhava. Funcionava na Casa dos Meninos de Olinda. Era um
trabalho social ligado à Secretaria de Saúde. Algum tempo mais tarde tive
oportunidade de visitar o local.
Na ocasião da visita conheci a botânica Maria Luíza Rego (a Morena) e a médica Evani Araújo. Pessoas encantadoras. Conheci ainda Marcelo Mezel, um médico acupunturista,
à época secretário de governo da prefeitura de Olinda. Todos trabalhando no
mesmo projeto, integrando fitoterapia, saneamento básico, coleta seletiva de
lixo, reciclagem etc.
Já havia em Olinda nesta época, a distribuição gratuita de remédios
fitoterápicos e um posto de saúde onde se pesquisava a resposta do paciente às
diversas opções de tratamento. Acompanhamento médico.
A partir daí formamos, e
ainda somos, um grupo bem humorado. Quando de minhas viagens à Olinda, sempre
almoçávamos juntos. Nossa refeição era regada a piadas que não perdoavam nem
mesmo a medicina popular. A planta afrodisíaca “esquentai”, vendida nas feiras
do Recife, era um dos motivos de gozação.
Algum tempo depois, em 1986, Pernambuco seria a sede de um evento
integrador de vários pesquisadores que trabalhavam com fitoterapia, mediante um
curso de Fitoterapia a nível de pós-graduação realizado em Carpina, na sede do
Centro de Treinamento da EMATER-PE. O curso era coordenado pela professora Genisa Bulhões da Universidade de Recife com a assistência do marido,
também professor universitário. Proferi dois módulos neste curso, em companhia
de uma autoridade da Universidade do Paraná, o professor Eduardo Augusto Moreira. Neste mesmo curso reencontrei Evaní e Morena e tive o privilégio de conhecer a pesquisadora do Ceará Francisca Simões, que me foi
apresentada pelo meu amigo, o professor Francisco
José de Abreu Matos.
Eu havia sido apresentado ao professor Matos algum tempo antes, em Fortaleza, por ocasião do Simpósio
Brasileiro de Plantas Medicinais. O fato de termos o mesmo sobrenome (o meu Mattos é com dois “tês”) chamou a
atenção de todos. Ambos cearenses, mesmo sobrenome e dedicados a plantas
medicinais. No entanto, salvo algum parentesco que minha mãe detectou por
intermédio dos Abreu e não dos Matos, vale a expressão do próprio
professor: “apenas muito bons amigos”. Muito me honraria contudo o parentesco
com alguém tão iluminado. Além do mais, devo a ele ter conhecido Francisca Simões de cuja amizade fui
merecedor, bem como de seu marido, um engenheiro civil a quem eu chamava de Niemeyer, uma referência ao seu
envolvimento com a construção de edifícios em Fortaleza.
Mas voltando ao curso de Carpina, lá tive também o prazer de conhecer Ana, uma agrônoma impressionante que
trabalhava com plantas medicinais no Jardim Botânico de Recife. A dedicação
desta criatura ao trabalho com plantas medicinais era para mim um grande
exemplo. Com Ana tive o privilégio
de intercambiar valiosos materiais sobre o assunto, entre bibliografias,
sementes e mudas.
Ainda estávamos na década de 80. O tema Plantas Medicinais ganhava força
no Brasil. Algumas iniciativas no sentido de colocar a fitoterapia como opção
na rede pública de saúde podiam ser percebidas em vários estados da federação.
Em Fortaleza o projeto “Farmácias Vivas” do professor Matos servia de modelo.
No Distrito Federal, minha amiga Maria
Aparecida Costa, médica, liderava o movimento, tentando
integrar elementos da universidade (UnB), da Secretaria de Saúde e da iniciativa
particular. A iniciativa particular compreendia na época, a firma Farmacotécnica e a Farmácia Verde de “seo” Beija.
“Seo” Beija era um
farmacêutico prático tradicional que cedera um imóvel de sua propriedade em
Brazlândia, para que o governador do Distrito Federal, José Aparecido de Oliveira, lá instalasse uma farmácia viva, a qual
funcionava gratuitamente sob supervisão de “seo”
Beija. O filho, o médico ortopedista Inácio
Republicano, também trabalhava com fitoterapia, tendo herdado do pai os conhecimentos
ancestrais que incorporara ao saber conquistado na universidade. Uma amiga
minha, Dra. Fábia, estagiava então na farmácia do “seo” Beija.
Algum tempo depois, quando da aposentadoria de Dra. Maria Aparecida, Dra. Fábia veio a substituí–la no cargo,
na Secretaria de Saúde.
Ainda em meados dos anos 90, o Paraná mantinha uma posição de destaque
quando o assunto era fitoterapia e estava promovendo cursos e simpósios sobre a
matéria. Atendendo a um convite para participar de um destes eventos, tive o
prazer de conhecer a médica Marli
Perozin, a qual mais tarde se tornaria presidente da Associação Para Fitoterapia no Serviço Público, entidade que
congregaria todos nós naquele período.
Em Brasília
existe hoje, 2014, o Núcleo de Suporte à Assistência Farmacêutica em Terapias Não
Convencionais da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, chefiado por nosso
amigo o farmacêutico Nilton Luz Netto Junior, que inclui a pesquisa e o fomento de plantas medicinais.
Grande suporte para as pesquisas no Distrito Federal, Roberto Fontes Vieira, pesquisador da Embrapa-Cenargen tem colaborado fortemente com o projeto em curso atualmente na UnB.
Foto: Pesquisadores em plantas medicinais, por ocasião de um Congresso Brasileiro de Olericultura, neste evento maioria agrônomos e biólogos.
2 Comentários:
Minha Primeira contribuição, meu amigo Jean Kleber.
****
O PICÃO ROXO
*
Andei com uma dor nos quartos
Vejam que situação.
Aí me recomendaram
Tomar um chá de picão,
Saí me maldizendo
E fui logo dizendo:
Esse diabo tomo não!
*
Mas o doutor raizeiro
Correu atrás de mim
Me chamou lá num cantinho
E já foi dizendo assim:
Experimente o tal picão
Que a sua situação
De dor vai chegar ao fim.
*
Olhei bem desconfiada
Pro vendedor de raiz
Foi quando senti de novo
Aquela dor infeliz
Era uma dor bem profunda
Subindo o rego da bunda
Se espalhando pelos quadris.
*
Eu tinha que me render
A tal fitoterapia
Mas uma dúvida atroz
De verdade me afligia
Será que o tal picão
É cipó ou solução?
A gente toma, ou enfia?
*
Era a dor me consumindo
Era bem grande a aflição
E tinha que ser do roxo
Pra fazer efeito o picão
Resolvi entrar no cipó
Se a dor de mim não tem dó
Não vejo outra solução.
Texto: Dalinha Catunda
Genial como sempre ! Beijo.
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