Suaveolens

Este blog foi criado por um cearense apaixonado por plantas medicinais e por sua terra natal. O título Suaveolens é uma homenagem a Hyptis suaveolens uma planta medicinal e cheirosa chamada Bamburral no Ceará, e Hortelã do Mato em Brasília. Consultora Técnica: VANESSA DA SILVA MATTOS

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Local: Brasília, Distrito Federal, Brazil

Cearense, nascido em Fortaleza, no Ceará. Criado em Ipueiras, no mesmo estado até os oito anos. Foi universitário de agronomia em Fortaleza e em Recife. Formou-se em Pernambuco, na Universidade Rural. Obteve o título de Mestre em Microbiologia dos Solos pelo Instituto de Micologia da Universidade Federal de Pernambuco. Também obteve o Mestrado e o Doutorado em Fitopatologia pela Universidade de Brasília. Atualmente é pesquisador colaborador da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília.

31.1.08

Y-puera

Por
Lin Chau Ming

Ipueira, corruptella de “y-puera”, água que foi, curso de água extincto, braço ou canal de rio que não corre, sacco, bahia fluvial. Assim nos diz Theodoro Sampaio, em seu livro “O tupi na geografia nacional”, publicado em 1914 e que eu comprei em um sebo em São Paulo dois anos atrás. Segundo o autor, a palavra vem da junção de “y”, que significa, na língua Tupi, “água” e “puera”, “que já foi”.
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No belíssimo livro de Antonio Geraldo da Cunha, “Dicionário histórico das palavras portuguesas de origem Tupi”, a palavra é apresentada com o significado de “terreno alagado; charco formado pelo transbordamento dos rios, onde as águas se conservam por vários meses” e são também citadas passagens onde esta palavra é utilizada por diversos escritores brasileiros, como por exemplo Castro Alves, em “A Cachoeira de Paulo Afonso”:
E tu desces ó Nilo brasileiro,
As largas ypoeiras alagando,
E das aves o coro alviçaeiro,
Vae nas balsas teu hymno modilhando!
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Não conheço Ipueiras, mas lendo os trechos citados nos livros, é possível imaginar o ambiente original onde foi fundada esta cidade do interior do Ceará. E mais ainda, com as crônicas e poesias escritas no blog do Jean Kleber, quase um ipueirense, fico imaginando a cidade.
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Entrei em sites que se referem a ela, bonita, como muitas cidades do interior do Brasil, calma, apesar de agitos culturais. Como lembranças do ambiente original onde o Coronel Manuel Martins Chaves fundou a Fazenda Ipueiras, que mais tarde viria a ser dividida e onde foi fundada a cidade, ainda existem os lagos, comprovando o acerto no nome dado àquela fazenda.
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Das fotografias antigas que encontrei, o rio Jatobá deve ser o pai (ou a mãe) das ipueiras da cidade, que bem plana, apresenta alguns morros a observar as terras baixas indo longe, a perder de vista. Do campo de futebol da época, de várzea, lógico, justificando o nome, tanto da cidade quanto do campo, com os jogadores dos times postados para as fotos, é possível imaginar a extensão dessas áreas. Quantos jovens não se divertiram nas peladas nesses campos, quando o futebol amador ainda tinha sua graça, servia como esporte, saúde, entretenimento e convívio social?
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Além de divertimento, as terras úmidas forneciam material de boa qualidade para produtos cerâmicos, a serventia era bem grande, como podia ser vislumbrado nas palavras de Euclides da Cunha, em “Os Sertões”:
Intercorrem, ainda, paragens menos estéreis, e nos trechos em que se operou a decomposição in situ do granito, originando algumas manchas argilosas, as copas virentes dos ouricuryseiros circuitam, parenthesis breves abertos na aridez geral, as bordas das ipueiras.
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Ainda hoje, nessas terras, “as ipueiras verdolengas” de “Grande Sertões: Veredas”, os agricultores retiram o alimento para a população da cidade, apesar do avanço dos produtos industrializados. Mas comer alimento fresco e saudável e poder conversar e ajudar os agricultores locais é uma decisão que ainda pode ser tomada por lá, para o bem de todos.
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Também se pode ver, poucas, é verdade, infelizmente, palmeiras típicas desses lugares mais úmidos, como as carnaubeiras e os buritizeiros, altivos, porém, como dito agora, solitários, órfãos que ficaram pela ação devastadora dos ipueirenses de outrora. Muitos ipueirenses ainda se lembram dessas árvores, cantando em versos e prosas, outros lembram-se de árvores, porém, daquelas que já não mais existem na cidade.
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Dos prováveis cinco lagos que existiam à época da fundação da cidade, hoje, decerto, algumas estão apenas nas lembranças dos moradores mais antigos. Calçadões margeiam uma que sobreviveu, mas a mão humana continua modificando a paisagem, espero que desta vez para a melhora da qualidade de vida dos moradores da cidade.
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Porém, o bravo Jatobá sofre, mas resiste, como todo nordestino, esperando atitudes mais nobres por parte das pessoas, para poder continuar oferecendo, à noite, o que Guimarães Rosa, em Sagarana, disse: “No covo da ipueira, o coaxar dos sapos avançava longe e voltava – um... um...um... – como se corressem escalas em enorme teclado fanho.
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Foto: calçadão do açude de Ipueiras, com a ciclovia e os "Neems" da arborização.
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Lin Chau Ming é engenheiro agrônomo pela Escola Superior de Ensino "Luiz de Queiroz" da Universidade de São Paulo (1981), doutor em Agronomia (Produção Vegetal) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1996) e doutor em Ciências Biológicas (Botânica) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1995). Atualmente é professor adjunto da UNESP em Botucatú-São Paulo. É editor chefe da Revista Brasileira de Plantas medicinais. Este ano (2007), está em Nova York, na Columbia University, fazendo pós-doutorado na área de Etnobotânica.

4 Comentários:

Blogger Jean Kleber disse...

Uma grata surpresa. Prof. Lin homenageia Ipueiras em seu primeiro artigo do ano para o blog. Algo inusitado e comovente. Lá de New York meu colega "converte-se" a Ipueiras, de tanto que a enaltecemos aqui no blog. Gratos ao Lin pela carinhosa homenagem.

31.1.08  
Anonymous Anônimo disse...

Como sou um apaixonado por Ipueiras e já escrevi alguns textos sobre essa cidade, fico feliz por você ter dedicado um pouco de seu tempo na pesquisa sobre minha terra. Obrigado Lin!

31.1.08  
Anonymous Anônimo disse...

Uma cidade de Tocantins também tem o mesmo nome, talvez alguém da homônima cearense não tenha tido a idéia de homenagear a terra natal?
Ou talvez porque exista um rio com "y-puera" em suas margens?
Abraços.
Lin

2.2.08  
Blogger Jean Kleber disse...

A origem do nome da cidade homônima do Tocantins, quem sabe, mais nova que a Ipueiras do Ceará, ainda não sabemos. Pode-se especular com várias hipóteses, portanto. Legal, sua pesquisa, Lin.

4.2.08  

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