Por José Costa Matos
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Bati nas pedras de um tormento rude / e a minha mágoa de hoje é tão intensa, / que eu penso que a alegria é uma doença / e a tristeza a minha única saúde.´
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A constituição profética dos grandes poetas levou Augusto dos Anjos a ir além do seu tempo. E escreveu estes versos que parecem muito mais acontecimentos desta civilização do estresse, carregada de doenças novas ainda sem nomes específicos nos diagnósticos.
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Um sábio cristão, Alceu Amoroso Lima afirmou: ´Não temos direito à alegria. Temos o dever da alegria.´ Fala-se nesse dever e reaparece, lá na diocese de Sobral, um campeão de humildades que repetia no seu jornalzinho: ´O pessimismo não é cristão.´ Monsenhor Olavo Passos tinha uma feira de pensamentos alegres para os rapazes marianos de sua liderança.
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Já se falou muito em alegria. A liturgia da missa na Igreja Católica era dialogada entre celebrante e acólito:
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- Entrarei no altar de Deus.
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- Do Deus que é a alegria da minha juventude.´
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Ad Deum qui laetificat juventutem meam.´ Na beleza deste latim, e em nome da comunidade presente, o acólito falava de um Deus que alegrava a juventude de todos. Todos jovens, todos alegres.
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Mas falar em Deus tornou-se uma velharia. A ciência cresceu. Ocupou mais pensamentos e livros. Renan, com muita fé, escreveu ´O Futuro da Ciência´. A economia pareceu dividida em marxismo e capitalismo, mas essas filosofias estavam unificadas na valorização do poder de comprar.
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John Maynard Keynes, economista, acreditava no homem capaz do racional, mas nunca antes de esgotar todas as alternativas contrárias ao raciocínio. Na verdade, só uma racionalidade muito rasa não descobre a base comum de marxismo e capitalismo.
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Quando teorizou a psicanálise, Sigmund Freud não temeu velharias. Para aclarar o mistério dos complexos, buscou apoio no teatro de Sófocles, que viveu no século V antes de Jesus Cristo...
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E a suprema aspiração da felicidade, com passagem pela alegria. E equívocos sem número na História. Na busca do requinte alegre, os guerreiros de Síbaris treinaram seus cavalos para a dança ao som de flautas. Povo inimigo, os citas sabiam disto. E os citas levaram flautistas para o campo de batalha. Os cavalos dos sibaritas foram dançar as músicas das flautas. E os seus montadores foram destroçados pelos citas.
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Nos séculos XV e XVI, a busca da alegria estava no descobrimento de rotas do mar grande.
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A rota das Índias: riquezas, as especiarias, a pimenta-do-reino, cravo, canela, perfumes, sabões...Diz o francês Michelet que seus antepassados passaram mil anos sem tomar um banho.
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A rota do Novo Mundo: a prata, o ouro, o mentira verde das esmeraldas, a maravilha dos latifúndios nas sesmarias, e até a fuga ao tédio. Contra as mesmices de Castela-a-Velha, Juan Ponce de León atravessou o Atlântico. Descobriu a Flórida e morreu de alegria: no dia de São João bendito, achou ´algo nuevo que mirar.´
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Marcel Proust indica remédio contra as falências da promessa de alegria dos turismos. O verdadeiro descobrimento das viagens não é o encontro de novas paisagens. É o descobrimento de novos olhos...Futebol. Carnaval. Opções de todos os caminhos. Alegrias de massas. Mas depois do grito de gol, depois do samba-no-pé, em canto ou em pranto, cada um se defronta com sua equação pessoal.
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E Deus?
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Foto : parentes e afins do poeta Costa Matos em alegre excursão nas cercanias de Fortaleza, no Ceará.
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José Costa Matos, ilustre poeta, contista e escritor cearense várias vezes premiado, é membro da Academia Cearense de Letras. É natural de Ipueiras-Ceará.
3 Comentários:
Jean Kleber,
É sempre gratificante acessar o Suaveolens e encontrar textos dessa categoria.
Costa Matos é parte viva da história de Ipueiras e eu, particularmente, muito me orgulho e tê-lo como conterrâneo.
Um abraço,
Dalinha
Sinto-me feliz e orgulhoso de ter Costa Matos como conterrâneo.
A pequena Ipueiras torna-se grande, bem grande quando ele escreve.
Sua poesia perfuma o ar da cidade e o ipueirense torna-se um povo mais conhecido e mais tolerante.
Sua crônica é lida e relida, onde se busca sabedoria e cultura.
Jean Kleber,
Parabens pelos 64 anos. O bom é que nem parece que você já conta esse tempo. Que as células-tronco, se precisar e a proteção de Deus, que nunca falta, permitam que você continue contando para nós muitas e muitas aventuras. Abraços do Tadeu Fontenele.
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